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[LIVRO DAS VIRTUDES] Os Príncipes-Demônios

 
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Adonnis
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:10 am    Sujet du message: [LIVRO DAS VIRTUDES] Os Príncipes-Demônios Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Asmodeus, Príncipe-Demónio da Luxúria



    Uma criança precoce

    Há muito tempo nasceu em Samarra, uma pequena aldeia de agricultores, não longe de Oanylone, um menino a quem os seus pais chamaram de Asmodeus. Era forte e cheio de vida. Os seus olhos eram de um negro profundo e cativante. O seu rosto era belo a tal ponto que podia ser confundido com um anjo. Mas fora grande a surpresa dos seus pais quando constataram no seu corpo uma estranha deformidade. Como eram simplórios e aquilo parecia fora do comum, decidiram ver o velho Gedeón, curandeiro de profissão que vivia afastado dos homens.
    Este último era um homem com a cara enrugada pelos anos e que manteve a sua fé em Jah intacta. Pegou o pequeno dos braços da sua mãe, colocou-o sobre uma mesa e lentamente desapertou-lhe a fralda a fim de o examinar. Qual não foi o seu espanto quando viu que o bebé não tinha um sexo, mas dois! Era ao mesmo tempo feminino e masculino. Então voltou-se para os seus pais.


    Citation:
    Curandeiro: Vocês trouxeram ao mundo um ser fora do comum. Isto está além de minhas habilidades. Não sei se é uma mensagem que vos foi enviada pelo Altíssimo, ou se…


    Não conseguira terminar a sua frase. Vestiu apressadamente o recém-nascido e entregou-o ao casal que esperava uma resposta com ansiedade.

    Citation:
    Curandeiro: Vocês não devem voltar mais aqui com esta criança. Aconselho-vos que se voltem para Jah e que Lhe rezem repetidamente. Quanto a… ele, amai-o o melhor que podeis e afastai-o do Mal.


    Com temor e preocupação a pequena família regressou a sua casa. Foi neste ambiente que a criança cresceu.
    No momento em que ele começou a andar, os problemas para o pai e para a mãe começaram.
    Asmodeus adorava particularmente observar os animais no curral. Ele fascinava-se todos os dias ao vê-los mexer-se, comer e emitir sons curiosos. Mas o que mais o maravilhava era vê-los acasalar. Aquela era das suas maiores emoções. Proferia pequenos gritos que pareciam acompanhar os animais na sua reprodução. Batia palmas a cada manifestação viril do bode ou do touro. O seu pai em vão tentou repreender, ameaçar e bater, mas nada funcionou.
    Aos cinco anos, tentou algumas "experiências" com os animais. Conhecia bem os hábitos das espécies que viviam ao seu redor. Decidiu mudar a ordem natural das coisas, colocando o cão com a porca ou o gato com o pato. O resultado foram ferimentos cruéis que não serviram para saciar o seu entusiasmo.




    A Revelação

    Aos dez anos de idade, enquanto participava da colheita do mês de julho, ocorreu um evento que mudou a sua vida. Era o fim do dia e quase todos os agricultores já tinham regressado a casa. Estava sozinho num campo, no meio de montes de palha habilmente dispostos separadamente. Observava um casal de escaravelhos que subia um sobre o outro. De repente, a sua atenção foi desviada pelo ruído estridente que parecia vir de uma mó de moinho. Atraído por esses sons incomuns, ele decidiu aproximar-se o mais discretamente possível. E nesse lugar, descobriu o que nunca tinha visto antes: um homem e uma mulher, completamente nus, os corpos entrelaçados transbordando de sensualidade e adoptando as posturas dos animais que lhe eram tão familiares. Ele não se mostrou, mas observou-os enquanto pôde, sentindo nas profundezas do seu corpo emoções insólitas.

    De regresso a casa, não pregou olho durante a noite inteira, a sua mente estava completamente consumida pelo que acabara de ver.

    A manhã seguinte foi para ele como um segundo nascimento. Observava agora as raparigas e os rapazes da sua idade de uma forma totalmente diferente. A sua constituição genital fazia com que ele se sentisse atraído igualmente por ambos os sexos. Aproximou-se de todos os meninos e meninas da sua aldeia, dos bonitos e das bonitas, dos pequenos e dos grandes, dos magros e dos gordos.

    O seu método era pouco ortodoxo, para dizer o mínimo. A abordagem era muitas vezes brutal, semelhante a um ataque violento, que terminava por tombar numa vala ou num riacho. O parceiro debatia-se, gritava, arranhava, mordia, lutava e acabava fugindo-lhe do abraço, não sem antes ter perdido uma parte das suas calças ou vestido.

    O cenário repetiu-se durante uma semana inteira. Por fim, numerosos habitantes da aldeia, indignados com esta conduta intolerável, invadiram a fazenda da família e foi por pouco que o pequeno Asmodeus conseguiu fugir aterrorizado, sem esperar o que se sucederia.




    Chegada a Oanylone

    Oanylone era nessa época a maior cidade da terra. Ela abrigava em seu seio, provavelmente, mais de um milhão de pessoas. Mas, a acídia tinha conquistado os corações e corrompido as almas. A maioria dos habitantes afastara-se de Jah. É neste contexto que chegou o pequeno Asmodeus, ainda muito abalado com o que acabara de viver.

    Vagueou durante dias e dias pelas ruas, vivendo de roubos e da mendicância. Dormia durante a noite no chão em meio ao que havia de mais vil e desprezível naquela cidade. Sujo como um piolho, lamacento como uma cabra, os seus passos levaram-no por acaso a um bairro da cidade muito diferente dos outros. Mulheres de pequenas virtudes vendiam o seu charme aos homens que passavam. Algumas eram ainda jovens e frescas, outras gastas e murchas pelo “trabalho”. Ele reparou numa delas, ruiva, mais forte do que a média e com seios generosos. Aproximou-se dela e estendeu a mão como se fosse pegar um fruto proibido. Esteve bem até que uma bofetada magistral de uma mão lhe veio recordar a sua idade e a sua condição.

    A mulher começou a vociferar palavras num tom seco e rápido.


    Citation:
    Mulher: Diz-me lá moçoilo, quem te deu permissão? E de onde é que vem este pirralho? Coberto com tanta sujeira dou-te uma semana antes de te ver morto no riacho.


    Ela soltou uma gargalhada grosseira e sonora, com ambas as mãos pousadas nos quadris, testemunhada pelas mulheres à sua volta bem como pelos transeuntes. Inclinou-se um pouco para o observar mais de perto, segurando o seu queixo entre as mãos.

    Citation:
    Mulher: Mas debaixo desta sujidade és bem mais bonito. Se fosses um pouco mais velho dar-te-ia uma boa …


    Ela não conseguiu acabar a frase. Como uma cobra sobre a sua presa, Asmodeus colocou os seus lábios sobre os dela, fazendo recuar a mulher surpreendida, que respondeu com uma risada ainda mais grosseira que a primeira.

    Citation:
    Mulher: Decididamente agradas-me! Vem comigo lá dentro, quero mostrar-te duas ou três coisas, ensinar-te a história da vida.


    O quarto no qual entraram estava escuro, pois não tinha janelas. Tochas iluminavam debilmente o interior, que consistia de quatro delas dispostas em camadas nos quatro cantos. O que servia de cama era um colchão cheio de palha e as travessuras podiam ser escondidas dos olhos dos visitantes por um tecido estendido a toda a volta. Nas paredes, Asmodeus não acreditava no que os seus olhos viam, cenas eróticas mostravam homens e mulheres nus, em posições por vezes acrobáticas, frequentemente surrealistas. Então disse para si próprio que tinha muito que aprender.

    A mulher forte atirou-o literalmente sobre o seu leito. Despiu-se lentamente diante dele, fazendo aparecer as suas abundantes curvas e as suas protuberâncias. Depois ela começou a fazer o mesmo com o rapaz. Um grito fez-se ouvir. Ela não conseguiu reter o seu espanto perante a anomalia sexual de que era provido Asmodeus.


    Citation:
    Mulher: Tem consciência que tens um brilhante futuro traçado!


    E nesse dia, ele perdeu a inocência.



    A cidade afunda-se na depravação

    Ele viveu durante muitos anos ao lado da mulher, tornando-se seu amante, partilhando a sua cama e os seus clientes. Mostrava-se particularmente formidável e activo, multiplicando os seus actos como se a sua vida dependesse disso.
    Com a idade, o seu corpo desenvolveu-se e formou-se. Uns seios firmes vieram adornar o seu busto. Apanhou o hábito de deixar crescer os seus belos cabelos negros mas também de manter as roupas masculinas. Tornou-se o foco de interesse de tudo o que a cidade pudesse contar sobre depravação.

    A sua fama era tal que um dia ele foi introduzido à corte do rei de Oanylone. Este homem era tudo o que havia de mau. Um verdadeiro concentrado de inveja, avareza e desonestidade. Vivia cercado por uma multidão de esposas e cortesãs. Orgias sucediam-se às orgias, e festas às bebedeiras. Jah tinha abandonado este lugar. Tinha ouvido falar deste jovem misterioso, capaz de proporcionar prazeres inéditos. Mandara-o chamar.

    Asmodeus compareceu na corte um dia em que a festa atingira o seu auge. As mesas tal como as cadeiras tinham sido derrubadas, os corpos estavam deitados no chão. A maioria estava nu, entrelaçada, presa e como que acorrentada pelo prazer. Os escravos, também nus, tentavam também juntar-se tanto a homens, como mulheres, que se abraçavam em posições obscenas. Traziam sobre pratos de marfim tudo o que era necessário aos prazeres orgíacos.
    Logo que o rei o viu entrar na sala, empurrou de alguma forma a meia dúzia de seres bêbedos que estavam amontoados ao seu lado, levantou-se e olhou-o fixamente nos olhos. Todos os que estavam à sua volta, homens e mulheres que participavam neste bacanal, uns após os outros, pararam o seu trabalho e fixaram o seu olhar no recém-chegado. O silêncio era agora completo.

    Asmodeus aproximou-se. Trazia um vestido de tecido branco que contrastava com o seu olhar de um negro intenso e a cor escura dos seus cabelos. Lentamente, ele descobriu os seus ombros e deixou cair as roupas no chão sem nenhum pudor, revelando a todos a sua desconcertante anatomia. Atravessou a sala. As pessoas desviavam-se do seu caminho. Ele foi ao encontro do rei que nada dissera e lançou-se brutalmente sobre ele. As pessoas soltaram um grito selvagem e a festa continuou de forma mais bela, como se todos se sentissem agora libertados.

    Asmodeus tornou-se o amante ou a amante do rei, conforme o ponto de vista que escolhermos. Catalisava as energias sexuais da corte que agora não conheciam qualquer limite. Mais grave ainda, este exemplo partindo de cima espalhou-se pelas camadas superiores da sociedade numa primeira fase e depois chegou ao resto dos habitantes da cidade.
    Nas casas, nas ruas, ou esgotos, nos campos ou celeiros, tudo não era mais que devassidão e luxúria. A depravação e o vício tinham substituído a virtude e a fé. Porque os homens agora tinham esquecido Jah, reservando a sua alma apenas aos prazeres.




    A queda

    Havia um ser que sem dúvida desfrutava mais do que os outros ao ver a decadência da cidade. Jah não lhe tinha dado um nome e ele deleitava-se ao ver até que ponto a obra do divino se degradava.

    Foi então que o céu se encheu de nuvens negras e ameaçadoras e que um vento violento começou a soprar. O Altíssimo dirigiu-se aos habitantes da cidade.


    Citation:
    Jah: Enquanto Eu vos dei o Meu amor, vocês desviaram-se, preferindo ouvir as palavras da criatura à qual não dei nome. Preferiram abandonar-se aos prazeres materiais em vez de me darem graças.


    Ele acrescentou:

    Citation:
    Jah: Criei para vocês um lugar chamado Inferno, que coloquei na Lua, onde os piores dentre vós conhecerão uma eternidade de tormentos para os punir pelos seus pecados. Em sete dias, a vossa cidade será envolta em chamas e aqueles que lá permanecerem passarão a eternidade no Inferno. Contudo, sou magnânimo, e aqueles que entre vocês saibam fazer penitência passarão a eternidade no Sol, onde se encontra o Paraíso.


    Perante essas terríveis palavras, todos os homens e mulheres se entreolharam e não ousaram mexer-se. Todos estavam agora com medo do seu destino. Um grande número decidiu sair da cidade agora maldita.
    Mas a Criatura Sem Nome, personificação do mal e tão astuta como sorrateira, decidiu agir. Escolheu entre os que restavam sete homens que cada um no seu género concentrava as trevas da humanidade. Asmodeus foi um deles. Deixou-se convencer por aquele que não tinha nome, que Jah não ousaria jamais passar a acção e que a sua decisão estava marcada pelo selo do ciúme. Pela influência que tinha sobre o rei, conseguiu convencer, por seu lado, este último, assim como a corte e uma grande parte dos habitantes a retomar a vida do prazer e da libertinagem.

    Não obstante, apenas alguns se reuniram à volta de uma mulher de nome Rafaela que era habitada pelo espírito de Jah. Ela fazia parte de um grupo de sete que tinham aberto os olhos perante o discurso do divino e que eram agora habitados pelo amor de Jah.

    Ela percorreu a cidade em todas as direcções, pregando o arrependimento e opondo-se directamente a Asmodeus. Estava ardentemente convencida de deter a verdade e muitos a seguiram e salvaram assim as suas almas. Mas a maioria dos homens preferiu voltar aos seus vícios.

    Sete dias mais tarde, um terremoto de poder sem precedentes atingiu a cidade. O solo fracturou-se. Apareceram grandes fendas de onde brotaram as chamas. Num instante Oanylone desapareceu nas profundezas da terra. Jah acabara de atingir com a sua cólera a cidade perversa.

    Todos os mortos apresentaram-se então perante o Altíssimo a fim de que este os julgasse. Rafaela e os outros seis humanos tornaram-se Arcanjos diante do Altíssimo, enquanto que aqueles que os tinham seguido se transformaram em anjos.

    Asmodeus e os seis outros homens que tinha escolhido o Sem Nome foram escorraçados para a Lua. Foram colocados num lugar frio, sem vida e numa neblina permanente. Os corpos de cada um deles transformaram-se para tomar um aspecto ao mesmo tempo hediondo e aterrorizante. Asmodeus recebeu uma cabeça abominável de serpente com uma língua desmesurada e foi provido de quatro pares de seios e de um falo de um comprimento elefântico. Tinha de o colocar permanentemente sobre o seu ombro para não o pisar. Os seus instintos luxuriosos foram aumentados e atormentava dia e noite os infelizes que se tinham perdido no Inferno, tanto como irritava continuamente os seus irmãos demónios perseguindo-os pelos seus desejos.

    Por isso, foi condenado a viver para sempre nas planícies do Inferno.

    Para registo, alguns retiveram algumas palavras de Asmodeus, pronunciadas na sua vida:


    Citation:
    - De todas as aberrações sexuais, a castidade é a pior.
    - Uma mulher sexualmente satisfeita é muito mais aberta.
    - Temos de ensinar as pessoas a servir-se do sexo como uma colher e um garfo.
    - Em termos de amor sexual, o apetite está sempre em mudança.


Traduzido do siríaco por Tibère d’Arcis

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Adonnis
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:11 am    Sujet du message: Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Azazel, Príncipe-Demónio da Gula



    A sua vinda ao mundo, já uma ruptura…

    Azazel veio ao mundo em Oanylone que se tinha tornado, desde há muito tempo, numa cidade próspera. Os seus habitantes começavam a viver ricamente e, se, no entanto ainda não haviam se desviado completamente do Altíssimo, os primórdios de sua queda apareceram inevitavelmente. Os seus pais, com idade por volta dos quarenta anos, decidiram ter um filho como decidimos comprar um objecto. Sem filhos durante quase 22 anos, por um capricho, os dois cônjuges, Céline e René foram ao encontro de uma mulher grávida e propuseram-lhe adoptar seu jovem filho fazendo-lhe ver que ele estaria melhor no seu meio. A jovem mulher, cujo homem havia fugido com uma bela sedutora, acabou por ceder e aceitou o pedido do casal. Assim, Azazel, nascido pobre, foi viver no luxo e na opulência cercado de pais exigentes, mas não devotados ao verdadeiro amor paternal.

    Azazel foi rapidamente entregue a si próprio. Nenhuma proibição... exceptuando não perturbar os seus pais. Em troca? O acesso a tudo, o sim a tudo. O pequeno rei não possuía nenhum limite. De natureza débil à nascença, Azazel tornara-se irreconhecível. Era agora reconhecido pelo seu excesso de peso precoce que lhe valeu a alcunha de glutão. O seu tamanho impunha medo junto dos seus companheiros. A sua forma rotunda, a sua gordura e os seus dedos inchados surpreendiam todos os que o conheciam. Da sua pele escorria gordura a cada raio de sol ou esforço, provocando a náusea àqueles que lhe queriam dar um aperto de mão. O seu sorriso e o seu olhar causavam desconforto a quem quer que se lhe aproximasse, pois eles emanavam hostilidade e desprezo.

    Era difícil nesta situação estar rodeado de amigos. Pelo contrário, Azazel cultivava a solidão e a descortesia. O olhar dos outros o deixava indiferente. Não lhe interessava. E quando decidia de outra forma, então o melhor era não cruzar o seu caminho. Quanto mais Azazel crescia, mais a sua força decuplicava ao ritmo e à medida que passavam os anos. Adolescente, já possuía uma força hercúlea. Por conta do pouco tempo gasto a instruir-se ele se tornava estúpido e parvo.

    A acídia reinava no seio da família. As consequências foram desastrosas para Azazel. Não ouvira falar do Altíssimo nem de Oane até ser tarde. Se bem que não compreendia porque o Altíssimo tinha criado o mundo e instalado o Homem como a sua espécie favorita. Esforçava-se por afirmar a quem o quisesse ouvir, que o Altíssimo tinha sido injusto face às suas ovelhas. Ele não poderia representar, a seus olhos, nada mais que perversão, zombaria e sadismo, tantas fossem as tentações que poderiam ser nomeadas.




    O ultraje e a renúncia à fé e aos princípios da virtude

    Um dia quando Azazel se dedicava às suas ocupações principais, comer e beber sentado à mesa no terraço de uma loja, encontrou-se com um servo de Oane. Este último ficou estupefacto ao ver um tal energúmeno agir de tal forma.

    Citation:
    O servo de Oane: Meu jovem amigo, posso sentar-me à sua mesa?

    Azazel: Faça-o caro amigo, e sirva-se.

    O servo de Oane: Obrigado. Mas eu acabo de almoçar e isso é o suficiente.”

    Azazel: E o vosso prazer? Tome e saboreie. São pratos deliciosos.

    O servo de Oane: Não tem vontade de se arrepender, meu filho, da fraqueza de que fazeis prova? Saiba que a gula quebrará os laços entre os homens e as mulheres.

    Azazel: Arrepender-me? Tanto trabalho por tão pouco. Olhe à sua volta, todo o mundo se dedica às suas ocupações sem se preocupar com os outros, e você, você permite-se julgar o meu apetite. Não é uma perda de tempo?

    O servo de Oane: Não há qualquer perda de tempo aqui. Da sua moderação depende o seu futuro no reino do Altíssimo.

    Azazel: Você parece esquecer-se de uma coisa Meu Servo. O reino do Altíssimo é feito de temperança, de moderação e bem, eu não o quero. Desde que me levanto, quero poder comer como me apetecer. Ao longo de todo o dia, desejo chafurdar-me em alimentos em quantidade a tal ponto que, uma vez satisfeito, ainda me resta espaço para o prazer de comer. O desejo de comer, a alegria que isso me proporciona é mais que suficiente para mim.

    O servo de Oane: Mas,...

    Azazel: Basta. Está a incomodar-me e não quero estragar mais o meu prazer para escutar os seus disparates.

    O servo de Oane: A misericórdia e a paciência do Altíssimo tem os seus limites que você acabou de ultrapassar. Eu pressagio que você terá um futuro muito sombrio e tortuoso.

    Azazel: E mesmo que assim seja. Este mundo e os princípios aos quais aspiro preenchem-me. E acredite em mim, preencherão mais que um. O Seu Altíssimo não saberá ser mais circunspecto face a esta circunstância. Mas na verdade, quando você o encontrar, diga-lhe que a minha mesa lhe está reservada…


    E o fiel, indignado, foi reunir-se com os seus irmãos. Entre os seus irmãos encontrava-se um tal Jorge e uma jovem rapariga Galadriel…

    Citation:
    O servo de Oane: Digo-vos, meus amigos.... Oanylone vive os seus últimos momentos. O Altíssimo não poderá deixar estes seres agirem desta forma muito mais tempo. Não pode continuar assim. É inconcebível. O glutão que acabei de ver convenceu-me desta ideia, se eu ainda tinha algumas dúvidas.




    O Servo da Criatura Sem Nome

    Com a morte dos seus pais, Azazel herdou uma fortuna considerável. Nada mais faltava a este jovem homem para levar uma vida de devassidão e de corrupção. As festas que organizava eram sumptuosas e todos os jovens burgueses da cidade compareciam. Havia lugar para todos os vícios e todas as depravações. Assistia-se ali a verdadeiras orgias e quanto mais o tempo passava, mais elas se prolongavam durante a noite e os dias que se seguiam.
    A comida e o vinho apresentavam-se em abundância, homens e mulheres saciavam os seus desejos mais vis. Todo aquele que tentasse agir com pudor, abstinência e ponderação caia na represália popular. Sofria a fúria destes seres a cada instante da sua vida. Este assédio corrompia os mais débeis. Só alguns fiéis resistiram.
    Esta juventude aduladora de Azazel repudiava cultivar-se e instruir-se, se bem que as universidades se esvaziavam cada vez mais.
    O trabalho, sinónimo de servidão, foi desonrado e inspirava apenas vergonha a quem continuava a viver na virtude. Ao mínimo desejo, Azazel e os seus discípulos serviam-se ou, como deveríamos dizer, roubavam tudo à sua passagem.
    Com o passar do tempo, paulatinamente, os instigadores do mal faziam trabalhos obscuros e, como é lógico, uniram-se para instaurar um clima de pecado.




    O combate e a decadência

    O Altíssimo lançou a sua cólera contra a cidade e os servos do Mal. A batalha durou sete dias. O combate foi duro e no início desigual. Mas superestimando a sua força, os maléficos perderam inicialmente algumas batalhas e depois finalmente a guerra.
    Azazel, neste combate honrou a sua força titânica. Cada golpe desferido prejudicava os servos do Omnipotente. A sua fúria e a sua cólera igualavam-se ao seu valor em combate e ao seu ódio contra os piedosos “cavaleiros” do bem.
    A luta teria sido favorável a Azazel se os seus homens, cheios de medo e covardia, não o tivessem traído percebendo que os sete futuros arcanjos se dirigiam para ele. Abandonado por todos, Azazel continuou a luta e não caiu até ao sexto dia. Utilizando as correntes forjadas pelo próprio Altíssimo, o Príncipe da Gula foi apresentado perante o Criador.




    Azazel: grande copeiro e mestre de vinhos do Inferno

    Azazel, derrotado, foi apresentado perante o Altíssimo. O glutão não deu prova de nenhuma forma de humildade e, com insolência, olhou o misericordioso directamente nos olhos.

    Citation:
    Azazel: Eu arrepender-me? Então ouve-me bem oh glorioso, grandíssimo. Venho perante Ti derrotado e vencido. A vitória hoje pertence-Te. Mas mesmo que voltasse atrás, lutaria pela Criatura Sem Nome. O vencido deseja-Te que saboreies a Tua vitória, porque Te digo, jamais abdicarei. A minha luta ao lado de quem Tu chamas de Mal é o meu destino e o meu maior prazer. E se ainda não estás convencido, então ouve isto:

      Eu renego a Ti que pretendes ser nosso Deus, nosso superior.
      Creio em Ti como criador do céu e da terra
      Denuncio e desejo reivindicar a Tua queda
      Porque não pode haver nenhum juiz.

      Prometo fidelidade ao meu ódio e à minha luta contra a Tua vontade,
      Aspiro a um mundo de liberdade onde cada um age como lhe apetecer.
      Renego os Teus valores que nos constrangem e nos alienam.
      Apelo à rebelião contra a Tua vontade.

      Que os teus servos te virem as costas.
      Que os seus olhos se abram à Tua Mensagem, à Tua Mentira.
      Que todos vejam o Teu Engano e a tua manipulação.
      Oh, eu Te prometo aqui, diante de Ti, que combaterei para te destruir.


    Ao ouvir estas palavras, o Altíssimo levantou-se e com toda a sua grandeza e magnificência enviou Azazel para a Lua.

    Na Lua, após a sua queda, Azazel viu o seu corpo mudar tomando uma forma bastante particular. Nada mais era que uma enorme massa de mal. O grande mestre de vinhos e copeiro assegura-se de prover a sede das almas caídas.

Traduzido do grego por Monsenhor Dariush.

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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:11 am    Sujet du message: Répondre en citant



Citation:



    Demonografia de Belial


    Nascimento de Belial

    Adiguaëlle, esposa de Théophile, era uma mulher virtuosa. Na grande cidade de Oanylone, ela cuidava dos pobres e necessitados. Todo o seu tempo era dedicados a eles. Passava pelas ruas imundas, estendendo a mão àqueles que eram esquecidos pelos mais ricos, pois em Oanylone as desigualdades estavam cada vez mais pronunciadas. Os ricos envolviam-se na opulência e na luxúria enquanto os mais desfavorecidos tornavam-se invejosos, ciumentos e cheios de raiva.

    Foi nestas circunstâncias que Adiguaëlle ficou grávida. Seu marido e ela estavam muito felizes e continuavam a viver no amor Divino, apesar de todos os dias, ao redor dela, as pessoas caluniarem e cuspirem na sua felicidade. "Por que ela devia ser feliz?", pensavam e falavam eles. Ela devia sofrer como todos à sua volta sofriam da pobreza. E foi nessas circunstâncias de raiva e ciúme que estes filhos nasceram. O primeiro chamou-se Micael, que segundo uma lenda significava "doe e ame" e o outro chamou-se Belial, o que significava "doas e receberás".

    Adiguaëlle estava exausta, tanto pelo parto quanto pela situação na rua, que a preocupava. Ela não fazia ideia que a Criatura Sem Nome fomentava os pesadelos mais vis contra a sua família, pois alimentava a dor, a cólera, o ódio contra os ricos e os felizes. E, uma noite, quando a família de Théophile menos esperava, a multidão transformou-se numa nuvem de raiva que se abateu sobre eles. Num último instinto de sobrevivência, Théophile tirou Micael e o seu irmão das mãos da sua mãe e, depois de os ter beijado, escondeu-os sob uma caixa. Ele apenas tinha pousado a caixa quando aqueles por quem Adiguaëlle trabalhava todos os dias entraram. Os homens gritaram contra Théophile e esfaquearam-no antes que ele pudesse defender-se. Adiguaëlle foi violada sucessivamente antes de ser eviscerada. Os golpes sucederam-se uma e outra vez, a lâmina passando de mão em mão, cada um dando um golpe fatal no corpo da pobre mulher. Mas as crianças, sob a sua caixa, foram poupadas, porque ninguém as viu.



    Infância de Belial

    Não sabemos como, mas as duas crianças foram salvas do incêndio que se seguiu. Foi uma dama complacente que os socorreu ou terá sido a Criatura Sem Nome que os esqueceu? Ninguém sabe realmente.
    Porém, sabe-se com certeza que eles foram acolhidos por Ménopus, um homem idoso e piedoso que nada sabia da origem destes "amores", como gostava de os chamar, e que nem mesmo queria saber. Ele dava a estes pequenos o leite que produzia graças à sua vaca Minerva. Estes dois meninos cresceram sem nunca se separarem. Havia entre eles um vínculo tão grande que ia além da amizade e do amor fraterno, mas, infelizmente, um deles acabaria por se afastar.

    Os dois irmãos cresceram longe das tentações da Criatura Sem Nome. Belial respirava piedade e continuava a cuidar dos outros mais do que de si próprio Ele permanecia próximo do seu irmão Micael que, também, se virava para o seu próximo, como Ménopus lhes tinha ensinado. Contudo, Belial não sabia nada dos seus pais e isso atormentava-o. "Como Ménopus os encontrara? O que acontecera com os seus pais para que ninguém ao seu redor lhes falasse deles?", eram pensamentos constantes em sua mente.



    A tentação de Belial

    Uma noite, após um longo dia de trabalho, Belial colocou-se a meditar no telhado da sua casa. O telhado da sua casa tinha um terraço que lhe permitia ver uma grande parte de Oanylone. Ele ficou ali muitas horas, a perguntar-se sobre o seu passado, sobre os seus pais, sobre a sua situação. Uma sombra veio até ele e envolveu-o delicadamente. O jovem adolescente não assustou-se com tal escuridão.

      Belial: Quem és tu? Tu que me vens ver ao cair da noite, és um amigo ou um inimigo?
      Criatura Sem Nome: Eu não tenho nome porque posso ser tudo o que quiseres, Belial. Olha à tua volta. Por que privilegiar os outros, especialmente quando eles não têm nada para te oferecer?
      Belial: Porque eles precisam de mim...
      Criatura Sem Nome: Serve então os ricos pois eles pagar-te-ão, assim não trabalharás de graça...
      Belial: Eu nunca trabalhei de graça. Essas pessoas precisam de mim e se eu não o fizesse, quem o fará no meu lugar?
      Criatura Sem Nome: O que te dão eles em troca? Nada. Eles praguejam contra ti, pois quanto mais lhes dás, mais eles te pedem. Afasta-te deles, pois eles far-te-ão infeliz.

    Naquela noite, Belial permaneceu pensativo por muito tempo após a Sombra ter desaparecido. Por que matar-se com o trabalho ao passo que os mais ricos poderiam cobri-lo de ouro? Este pensamento ganhou influência sobre ele à medida que a Sombra o veio ver novamente, corrompendo a sua mente.



    A corrupção de Belial

    Assim, ele começou a pedir aos pobres para lhe pagarem por seus serviços, algo que eles não podiam fazer. Então, ele parou de os ajudar, e voltou-se para a preguiça e o pecado. A sua vaidade e o seu orgulho tornaram-se visíveis aos olhos de todos. Belial tornara-se um belo homem e no seu rosto, cada vez mais, a sua ganância emergia. Ele só dava aos ricos a fim de receber cada vez mais, afastando-se do seu irmão que vivia em humildade. Seu irmão Micael implorou-lhe para voltar atrás na sua palavra e continuar a servir aqueles que realmente precisavam, mas ele riu-se dessas palavras. Belial ostentava agora um rosto emaciado e uma longa capa negra gasta por todo o lado. Aqueles que o rodeavam diziam que chifres demoníacos cresciam na sua cabeça. Mas Belial não se importava muito com isso. Ele sabia agora que cada um dos seus gestos era inestimável. Ninguém poderia ser mais piedoso que ele, vendendo muito caro os seus conselhos e os seus serviços.

    Homens começaram a acreditar nele e escutavam a sua palavra. Belial exaltava a sua superioridade sobre o comum. Ninguém tinha mais talento que ele. Os seus dedos tornaram-se longos e angulosos para melhor apanhar o ouro que ele acumulava. Ele sentia-se indispensável para a cidade, ele sabia-se indispensável para a cidade.



    Representação de Belial durante a sua condenação


    A Condenação Eterna

    Belial tornara-se um dos homens mais poderosos e mais respeitados de Oanylone. Enquanto a Sombra lhe sussurrava no ouvido, ele exortava as multidões a encontrar os traidores, tais como o seu irmão, que continuavam a escutar os falsos preceitos que Oane destilara na mente de todos. Muito rapidamente, Belial, o Orgulhoso, passou a fazer parte dos Inaudiendis (Nota: em latim, aqueles que não ouvem) juntamente com seis outros blasfemos que, durante os sete dias dados pelo Altíssimo antes da destruição da cidade, pregavam contra o Criador e as Suas obras, tal como contra os sete homens que representavam as sete virtudes, grupo no qual o seu irmão Micael estava incluído.

    E, quando a Ira do Altíssimo se abateu sobre a cidade, quebrando a terra e inundando as ruas com o fogo vindo do centro da terra, ele estava entre os condenados, com todos aqueles que permaneceram na metrópole, convencidos pelas palavras insidiosas da Criatura Sem Nome. Os inaudiendis foram enviados às profundezas dos abismos do Inferno Lunar, onde o fogo ruge e onde os pecadores são supliciados.

    Se olharmos, todos os seres da Criação são pecadores, mas o Altíssimo, na Sua grande bondade, ofereceu o perdão, e quem não o aceita conservará o seu pecado e sofrerá até o fim dos tempos. Na sua condenação, Belial transformou-se em uma criatura terrível, segundo dizem tomou como forma o corpo de um cavalo impetuoso e a cabeça de um touro raivoso.



    O exorcismo de Belial

    No começo da Igreja, esta era ainda frágil, e Belial pensou que, para melhor a destruir, era necessário agir pelo interior. Sempre tão orgulhoso, ele decidiu tomar posse do corpo do mais alto dignatário da Igreja: o Papa. Naquela época, o Papa Higino fora afetado por uma grave doença; Belial, cheio de covardia, possuiu-o, e a partir desse momento as feições do Santo Padre começaram a mudar. Um servo, Mirall, percebeu isso e implorou ao Altíssimo para enviar alguém. O arcanjo Micael, santo padroeiro da contra-possessão, nomeado mais tarde exorcista, foi enviado.

    Ele irrompeu tão rápido quanto lhe era possível, as suas seis asas batendo até perder o fôlego, afinal, se a Igreja caísse naquele momento, o resultado seria atroz. Ele entrou no corpo de Higino e, com isso, os seus pensamentos virtuosos deveriam destacar-se, mas do seu lado Belial lutava também.

    Belial: «Tu ousas intervir contra o teu próprio irmão, Micael? Tu não vês que o teu Deus se serve de ti?»
    Micael: «Tu não mais meu irmão, Belial. Eu renego-te, volta de onde vieste, volta a povoar o abismo, só Deus é soberano, só Deus é o mestre! Que somente as virtudes deste homem surjam!»

    Enquanto este confronto se desenrolava, o Paraíso Solar e o Inferno Lunar pareciam também lutar entre si numa batalha decisiva entre o bem e o mal.

    Micael: «Volta de onde vieste, Príncipe dos Demónios e deixa a alma deste homem em paz, ouviste? Vade retro Belial! Volta de onde vieste!».

    Naquele momento, uma chama surgiu da boca do possuído e foi bater longe no astro que domina a Noite, enquanto o céu retomava a sua cor normal.

    São Micael subiu aos céus em glória, sentado numa nuvem e acompanhado por mil vozes celestes cantando a glória de Deus, pois só Deus é soberano.


Code:
[quote] [img]http://i.imgur.com/8N7Pb.png[/img]

[list]
[size=24][b]Demonografia de Belial[/b][/size]


[size=15][b]Nascimento de Belial[/b][/size]

[i]Adiguaëlle, esposa de Théophile, era uma mulher virtuosa. Na grande cidade de Oanylone, ela cuidava dos pobres e necessitados. Todo o seu tempo era dedicados a eles. Passava pelas ruas imundas, estendendo a mão àqueles que eram esquecidos pelos mais ricos, pois em Oanylone as desigualdades estavam cada vez mais pronunciadas. Os ricos envolviam-se na opulência e na luxúria enquanto os mais desfavorecidos tornavam-se invejosos, ciumentos e cheios de raiva.

Foi nestas circunstâncias que Adiguaëlle ficou grávida. Seu marido e ela estavam muito felizes e continuavam a viver no amor Divino, apesar de todos os dias, ao redor dela, as pessoas caluniarem e cuspirem na sua felicidade. "Por que ela devia ser feliz?", pensavam e falavam eles. Ela devia sofrer como todos à sua volta sofriam da pobreza. E foi nessas circunstâncias de raiva e ciúme que estes filhos nasceram. O primeiro chamou-se Micael, que segundo uma lenda significava "doe e ame" e o outro chamou-se Belial, o que significava "doas e receberás".

Adiguaëlle estava exausta, tanto pelo parto quanto pela situação na rua, que a preocupava. Ela não fazia ideia que a Criatura Sem Nome fomentava os pesadelos mais vis contra a sua família, pois alimentava a dor, a cólera, o ódio contra os ricos e os felizes. E, uma noite, quando a família de Théophile menos esperava, a multidão transformou-se numa nuvem de raiva que se abateu sobre eles. Num último instinto de sobrevivência, Théophile tirou Micael e o seu irmão das mãos da sua mãe e, depois de os ter beijado, escondeu-os sob uma caixa. Ele apenas tinha pousado a caixa quando aqueles por quem Adiguaëlle trabalhava todos os dias entraram. Os homens gritaram contra Théophile e esfaquearam-no antes que ele pudesse defender-se. Adiguaëlle foi violada sucessivamente antes de ser eviscerada. Os golpes sucederam-se uma e outra vez, a lâmina passando de mão em mão, cada um dando um golpe fatal no corpo da pobre mulher. Mas as crianças, sob a sua caixa, foram poupadas, porque ninguém as viu.[/i]


[size=15][b]Infância de Belial[/b][/size]

[i]Não sabemos como, mas as duas crianças foram salvas do incêndio que se seguiu. Foi uma dama complacente que os socorreu ou terá sido a Criatura Sem Nome que os esqueceu? Ninguém sabe realmente.
Porém, sabe-se com certeza que eles foram acolhidos por Ménopus, um homem idoso e piedoso que nada sabia da origem destes "amores", como gostava de os chamar, e que nem mesmo queria saber. Ele dava a estes pequenos o leite que produzia graças à sua vaca Minerva. Estes dois meninos cresceram sem nunca se separarem. Havia entre eles um vínculo tão grande que ia além da amizade e do amor fraterno, mas, infelizmente, um deles acabaria por se afastar.

Os dois irmãos cresceram longe das tentações da Criatura Sem Nome. Belial respirava piedade e continuava a cuidar dos outros mais do que de si próprio Ele permanecia próximo do seu irmão Micael que, também, se virava para o seu próximo, como Ménopus lhes tinha ensinado. Contudo, Belial não sabia nada dos seus pais e isso atormentava-o. "Como Ménopus os encontrara? O que acontecera com os seus pais para que ninguém ao seu redor lhes falasse deles?", eram pensamentos constantes em sua mente.[/i]


[size=15][b]A tentação de Belial[/b][/size]

[i]Uma noite, após um longo dia de trabalho, Belial colocou-se a meditar no telhado da sua casa. O telhado da sua casa tinha um terraço que lhe permitia ver uma grande parte de Oanylone. Ele ficou ali muitas horas, a perguntar-se sobre o seu passado, sobre os seus pais, sobre a sua situação. Uma sombra veio até ele e envolveu-o delicadamente. O jovem adolescente não assustou-se com tal escuridão.

[list][b]Belial:[/b] Quem és tu? Tu que me vens ver ao cair da noite, és um amigo ou um inimigo?
[b]Criatura Sem Nome:[/b] Eu não tenho nome porque posso ser tudo o que quiseres, Belial. Olha à tua volta. Por que privilegiar os outros, especialmente quando eles não têm nada para te oferecer?
[b]Belial:[/b] Porque eles precisam de mim...
[b]Criatura Sem Nome:[/b] Serve então os ricos pois eles pagar-te-ão, assim não trabalharás de graça...
[b]Belial:[/b] Eu nunca trabalhei de graça. Essas pessoas precisam de mim e se eu não o fizesse, quem o fará no meu lugar?
[b]Criatura Sem Nome:[/b] O que te dão eles em troca? Nada. Eles praguejam contra ti, pois quanto mais lhes dás, mais eles te pedem. Afasta-te deles, pois eles far-te-ão infeliz.[/list]
Naquela noite, Belial permaneceu pensativo por muito tempo após a Sombra ter desaparecido. Por que matar-se com o trabalho ao passo que os mais ricos poderiam cobri-lo de ouro? Este pensamento ganhou influência sobre ele à medida que a Sombra o veio ver novamente, corrompendo a sua mente.[/i]


[size=15][b]A corrupção de Belial[/b][/size]

[i]Assim, ele começou a pedir aos pobres para lhe pagarem por seus serviços, algo que eles não podiam fazer. Então, ele parou de os ajudar, e voltou-se para a preguiça e o pecado. A sua vaidade e o seu orgulho tornaram-se visíveis aos olhos de todos. Belial tornara-se um belo homem e no seu rosto, cada vez mais, a sua ganância emergia. Ele só dava aos ricos a fim de receber cada vez mais, afastando-se do seu irmão que vivia em humildade. Seu irmão Micael implorou-lhe para voltar atrás na sua palavra e continuar a servir aqueles que realmente precisavam, mas ele riu-se dessas palavras. Belial ostentava agora um rosto emaciado e uma longa capa negra gasta por todo o lado. Aqueles que o rodeavam diziam que chifres demoníacos cresciam na sua cabeça. Mas Belial não se importava muito com isso. Ele sabia agora que cada um dos seus gestos era inestimável. Ninguém poderia ser mais piedoso que ele, vendendo muito caro os seus conselhos e os seus serviços.

Homens começaram a acreditar nele e escutavam a sua palavra. Belial exaltava a sua superioridade sobre o comum. Ninguém tinha mais talento que ele. Os seus dedos tornaram-se longos e angulosos para melhor apanhar o ouro que ele acumulava. Ele sentia-se indispensável para a cidade, ele sabia-se indispensável para a cidade.[/i]

[url=https://s33.postimg.cc/8mf25kgyn/Belial.jpg][img]https://s33.postimg.cc/8mf25kgyn/Belial.jpg[/img][/url]
[size=9][i]Representação de Belial durante a sua condenação[/i][/size]


[size=15][b]A Condenação Eterna[/b][/size]

[i]Belial tornara-se um dos homens mais poderosos e mais respeitados de Oanylone. Enquanto a Sombra lhe sussurrava no ouvido, ele exortava as multidões a encontrar os traidores, tais como o seu irmão, que continuavam a escutar os falsos preceitos que Oane destilara na mente de todos. Muito rapidamente, Belial, o Orgulhoso, passou a fazer parte dos Inaudiendis (Nota: em latim, aqueles que não ouvem) juntamente com seis outros blasfemos que, durante os sete dias dados pelo Altíssimo antes da destruição da cidade, pregavam contra o Criador e as Suas obras, tal como contra os sete homens que representavam as sete virtudes, grupo no qual o seu irmão Micael estava incluído.

E, quando a Ira do Altíssimo se abateu sobre a cidade, quebrando a terra e inundando as ruas com o fogo vindo do centro da terra, ele estava entre os condenados, com todos aqueles que permaneceram na metrópole, convencidos pelas palavras insidiosas da Criatura Sem Nome. Os inaudiendis foram enviados às profundezas dos abismos do Inferno Lunar, onde o fogo ruge e onde os pecadores são supliciados.

Se olharmos, todos os seres da Criação são pecadores, mas o Altíssimo, na Sua grande bondade, ofereceu o perdão, e quem não o aceita conservará o seu pecado e sofrerá até o fim dos tempos. Na sua condenação, Belial transformou-se em uma criatura terrível, segundo dizem tomou como forma o corpo de um cavalo impetuoso e a cabeça de um touro raivoso.[/i]


[size=15][b]O exorcismo de Belial[/b][/size]

[i]No começo da Igreja, esta era ainda frágil, e Belial pensou que, para melhor a destruir, era necessário agir pelo interior. Sempre tão orgulhoso, ele decidiu tomar posse do corpo do mais alto dignatário da Igreja: o Papa. Naquela época, o Papa Higino fora afetado por uma grave doença; Belial, cheio de covardia, possuiu-o, e a partir desse momento as feições do Santo Padre começaram a mudar. Um servo, Mirall, percebeu isso e implorou ao Altíssimo para enviar alguém. O arcanjo Micael, santo padroeiro da contra-possessão, nomeado mais tarde exorcista, foi enviado.

Ele irrompeu tão rápido quanto lhe era possível, as suas seis asas batendo até perder o fôlego, afinal, se a Igreja caísse naquele momento, o resultado seria atroz. Ele entrou no corpo de Higino e, com isso, os seus pensamentos virtuosos deveriam destacar-se, mas do seu lado Belial lutava também.

[b]Belial:[/b] «Tu ousas intervir contra o teu próprio irmão, Micael? Tu não vês que o teu Deus se serve de ti?»
[b]Micael:[/b] «Tu não mais meu irmão, Belial. Eu renego-te, volta de onde vieste, volta a povoar o abismo, só Deus é soberano, só Deus é o mestre! Que somente as virtudes deste homem surjam!»

Enquanto este confronto se desenrolava, o Paraíso Solar e o Inferno Lunar pareciam também lutar entre si numa batalha decisiva entre o bem e o mal.

[b]Micael:[/b] «Volta de onde vieste, Príncipe dos Demónios e deixa a alma deste homem em paz, ouviste? Vade retro Belial! Volta de onde vieste!».

Naquele momento, uma chama surgiu da boca do possuído e foi bater longe no astro que domina a Noite, enquanto o céu retomava a sua cor normal.

São Micael subiu aos céus em glória, sentado numa nuvem e acompanhado por mil vozes celestes cantando a glória de Deus, pois só Deus é soberano.[/i][/list][/quote]


Original: http://rome.lesroyaumes.com/viewtopic.php?t=53393&start=1
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:12 am    Sujet du message: Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Belzebu, Príncipe-Demónio da Avareza



    O nascimento e a infância de Belzebu

    Quando Oanylone já começava a sua longa descida aos abismos do pecado e se assentava nas ruínas da virtude, nasceu Belzubu, filho de Grodass e Irénee. Pesando seis quilos para sessenta centímetros, demorou muito para sair do ventre da sua mãe e deixou-a quase morta de cansaço. Exausta e machucada em todo o seu corpo, uma infecção grave levou-a alguns dias mais tarde, deixando o bom Grodass com um pequeno monstro tão grande quanto insaciável. Este homem, um fazendeiro famoso pela qualidade da sua produção, conhecido pela sua gentileza e bondade, não sabia como fazer para criar este pequeno. Na verdade, até aqui, apenas a sua esposa se tinha encarregado deste assunto difícil, por isso decidiu contratar uma criada. Os seus dois irmãos, Guignol e Pimpon, zombaram estrondosamente diante da chegada daquele pequeno ser, que em ultimo caso, representava apenas mais uma boca para alimentar. Belzubu foi amamentado até à idade avançada de cinco anos de idade, o seu pai mostrava-lhe pouca afeição, muito ocupado com o trabalho nos campos, mas isso não o impediu de crescer, criado por uma mulher dura e robusta que respondia ao doce nome de Rita. A mulher não gostava desta criança que considerava feia e desajeitada. A isto, acrescia o facto de que um bebé que havia matado a sua mãe para nascer já andava por caminhos sombrios. Também fez-lhe a vida tão dura quanto foi possível, não lhe fazendo nada e ensinando-lhe não mais que o mínimo.

    Por volta dos oito anos de idade, quando tinha idade suficiente de passear sem a sua madrasta, Belzebu foi levado por Grodass, decidindo que o seu filho o acompanharia para os campos, com o objectivo de lhe mostrar como cultivar os cereais e inculcar-lhe alguns princípios e valores básicos. Foi assim que, cada dia, chovesse, fizesse vento ou neve, o pequeno homem levantava-se de madrugada e acompanhava o seu pai a cultivar as terras. Este último nunca foi avarento nos conselhos, a maioria dos quais foram destinados para fazer da criança um fazendeiro bem sucedido:


    Citation:
    Grodass: - Vê, meu filho, um tostão é um tostão, guarda preciosamente cada tostão porque é importante!
    - Serve-te da tua cabeça, caramba! Deves aprender a vender e a comerciar, senão, o que será de ti quando cresceres?
    - Não esqueças que se queres ser o melhor, tens que estar convencido que és o melhor!
    - Não penses nos outros, pensa em ti, porque serás tu que vais gerir toda esta confusão!
    - A vida é como um guisado de feijão, quanto menos pedras tens, mais rico serás!


    É certo que hoje, esses conceitos têm pouco significado, mas a verdade é que esses preceitos marcaram a vida daquela criança. Assim, Belzebu começou desde cedo a compreender o que fazia da terra uma boa terra, e logo percebeu como comerciar e como jogar para obter os melhores lucros. Não se preocupava com os seus irmãos, preferindo aproximar-se do seu pai que via nele um sucessor promissor. Este último muitas vezes apresentava-o quando ia vender os frutos do seu trabalho para o mercado, dizendo a quem quisesse ouvir que ocuparia o seu lugar quando ele morresse. Isso fez crescer nos seus dois irmãos mais velhos, uma inveja e uma animosidade que se transformou gradualmente num ódio visceral, de modo que o faziam sofrer muitos maus tratos e lhe batiam e o insultavam cada vez que se cruzavam. O jovem Belzebu cultivou então uma imagem de si, selado em orgulho e arrogância, pensando que se os seus próprios irmãos o amaldiçoavam, era porque ele era melhor do que eles. Quanto mais crescia, mais se aproximava de Grodass e mais se afastava de Pimpon e Guignol. Ele tornou-se um príncipe aos olhos do seu pai e um inimigo mortal para os seus irmãos mais velhos. Assim, Belzebu só pensava nele e no seu futuro, tornando-se indiferente à sua família, tendo apenas o seu pai na sua mais alta estima.



    A ascensão e o acesso à fortuna

    Quando ele tinha apenas quinze anos, o seu pai, Grodass, agora desgastado e envelhecido por décadas de trabalho duro e firme, veio até ele. Ele pediu-lhe para se sentar e ouvir o que ele tinha a dizer:

    Citation:
    Grodass: Meu filho... eu estou velho e cansado... olha para mim, dobrado como uma bruxa velha e não aproveitei dos meus melhores anos. Tu és o único da família capaz de prosseguir com o que construí ao longo destes anos. Estas terras, as minhas terras, são agora tuas, e os teus irmãos que cultivam para mim, deverão ajudar-te. Confio em ti, sabes vender, sabes como fazer crescer o melhor trigo e o melhor milho!


    Belzebu estava orgulhoso que o seu pai lhe deixasse tudo o que tinha, mesmo que fosse dez anos mais novo que o seu irmão mais jovem. Ele não pôde deixar de perguntar:

    Citation:
    Belzebu: Mas pai, o que vais fazer com o teu tempo agora? Vais abandonar-me como fez a minha mãe?


    Grodass sempre pensou que até ao final da sua vida, ele faria longas viagens, ele sabia que era a hora para isso e explicou isso ao filho antes de deixar a casa da família para sempre. Encarregou-o de anunciar isso aos seus irmãos e de entregar a cada um uma carta que tinha escrito para eles. Ninguém mais teve notícias dele e jamais se voltou a falar de Grodass em Oanylone. O jovem Belzebu esperou que o seu pai deixasse a casa da família para rasgar as cartas que tinha que dar e, sabendo que os seus irmãos não seriam da mesma opinião que o seu pai, decidiu sem demora contratar um rufião para proteger o que lhe havia sido transmitido. Ele usou alguns relacionamentos e encontrou o homem que precisava, um escravo liberto do norte, grande como uma árvore e forte como uma rocha, com cicatrizes e cortes, chamado Astaroth. Quando Pimpon e Guignol regressaram dos campos, encontraram a porta fechada e Belzebu apareceu atrás deles, com o seu guarda-costas a seu lado. Com ferocidade e confiança disse-lhes estas palavras:

    Citation:
    Belzebu: O pai foi-se embora! Ele deixou-me as terras e a casa, e agora tudo o que era dele é meu! Vocês arruinaram a minha infância e estragaram-me a vida, por isso, para vos castigar, não vos darei nada! De modo nenhum que dois farsantes como vocês, que lucraram vergonhosamente com o dinheiro do vosso pai descansando por anos, colham agora dos frutos do seu trabalho! Ficarei com os vossos bens e o resto, saiam! Se, infelizmente, voltarem a pôr os pés nas minhas terras, eu vos enviarei Astaroth que se encarregará então de vos fazer passar da vida à morte, assim, saiam e não voltem!


    Belzebu fez sinal a Astaroth que se aproximou dos dois homens, batendo num e noutro e atirou-os ao chão; os dois irmãos, feridos no orgulho, não tiveram outra escolha que sair sem pedir a sua parte. Assim começou a ascensão de Belzebu. Ele aproveitou o que tinha aprendido, substituiu os seus irmãos por empregados que tinham sido despedidos no mercado e a quem pagava mal, sabendo que teria sempre mão de obra para aceitar o trabalho. Os seus campos deram grandes colheitas porque ele era um conhecedor dos cultivos, e assim começou a ganhar bastante dinheiro. Mas isso não foi suficiente, ele sabia que era o melhor, mas queria mais. Guardou tudo o que tinha ganho e gastava apenas quando era forçado. Ao longo dos anos, ele adquiriu mais terras e converteu-se num grande proprietário conhecido pela sua visão de negócios e sobretudo, pela sua intransigência nos negócios. Os seus produtos, davam sempre os maiores lucros e o que ganhava, guardava em casa num cofre, evitando gastar o menor tostão a não ser que fosse estritamente necessário. Durante quase dez anos, os olhos de Belzebu não desfrutaram de ninguém senão ele mesmo, desenvolveu um ego sobrevalorizado, pavoneando-se em Oanylone dizendo a quem quisesse ouvir que ele era o melhor e o único capaz de produzir bom cereal.



    No início dos seus trinta anos, Belzebu tinha adquirido, pela sua inteligência e a sua força de persuasão, a metade das culturas de cereais em Oanylone, a sua casa transformou-se num domínio e o seu dinheiro tinha-se transformado numa fortuna. Quando outros tentavam tirar proveito das suas riquezas, ele proibia qualquer um de se aproximar das suas propriedades, com o seu fiel Astaroth a seu lado, era temido e respeitado, mas também invejado e mal visto. Mensalmente, os enviados dos dirigentes vinham até ele e perguntavam-lhe se queria dar algum dos seus bens para ajudar a comunidade e, de cada vez, Belzebu dizia-lhes:


    Citation:
    Belzebu: O quê? Esbanjar a minha fortuna? Eu trabalhei duro para acumular tudo isto e ninguém além de mim irá beneficiar-se! Eu sou bom e as minhas colheitas são as melhores! Saiam da minha casa e digam-lhes que, enquanto for vivo, não conseguirão nada de mim!


    Assim, a cada vez, os enviados iam-se embora cabisbaixos e relatavam aos seus governantes, testemunhando o egoísmo de Belzebu e a sua incapacidade de entender o conceito de interesse colectivo. Àqueles que clamavam diante dos portões do seu domínio, o proprietário enviava o seu guarda para os aterrorizar. Para aqueles que diziam que ele tinha mais inimigos do que amigos, Belzebu respondia que não se importava de não ter amigos, porque eles eram principalmente aproveitadores.



    O sonho e a revelação

    Belzebu tinha trinta e cinco anos e, uma noite, quando o calor do Verão se fez sentir insuportável, com grandes dificuldades para dormir, ele teve um sonho estranho. Ele viu-se a andar, numa grande estrada desértica, sozinho, sem luz excepto a da lua, nenhuma casa, nada além daquele caminho sinuoso. Enquanto caminhava sem rumo, uma Criatura feita de Sombra apareceu. Belzebu parou e tentou ver o seu rosto, mas não viu mais do que uma sombra e, quando perguntou quem estava à sua frente, não obteve nada mais que o silêncio. Quando retomou o seu caminho, a Criatura falou-lhe:

    Citation:
    A sombra: Belzebu, Belzebu, Belzebu... Para onde vais assim?

    Belzebu: Eu não sei, sigo na escuridão, vou andando em frente.

    A sombra: Tu caminhas, mas não sabes para onde vais? Não te interessa saber?

    Belzebu: Saber? Saber o quê? Onde termina este caminho?

    A sombra: Não importa onde termina, o importante não é onde, mas como!

    Belzebu: Que queres dizer, Criatura?

    A sombra: O que eu quero dizer é que ficas satisfeito em seguires o caminho que te foi traçado em vez de seres tu a traçar o teu próprio caminho! Sai dos caminhos traçados e toma outro caminho!

    Belzebu: Mas... Eu não vejo nenhum outro caminho, Criatura, só há este!

    A sombra: Belzebu, tu és mais esperto que os outros, mais rico que os outros, podias ter os homens a teus pés, podes construir qualquer caminho a partir daqui, só tens que querer! Serve-te do que aprendeste, aproveita os teus conhecimentos e faz uso da tua astúcia para te fazeres mais forte no teu domínio e verás que apenas basta quereres para que um novo caminho te apareça!


    A sombra desapareceu num instante e frente a Belzebu, um cruzamento apareceu. De um lado, o caminho sinuoso que percorria há algum tempo, de outro lado, um caminho estreito, direito e ascendente, se levantou. Ele decidiu seguir este caminho, tendo a impressão que sabia o que havia no final. Ao acordar de manhã, Belzebu teve o cuidado de anotar o sonho que o invadiu durante a noite. Ele chamou Astaroth e pediu-lhe para cumprir as suas ordens à risca. Enviou-o ao mercado e ordenou-lhe que adquirisse todos os cereais disponíveis para depois os vender pelo dobro do preço que tinha comprado. De seguida, possuido por um frenesim incrível, ordenou-lhe que entrasse na casa de todos os proprietários de cultivo e campos de Oanylone, molestasse-os e obrigasse-os a vender, ao melhor preço, todas as suas colheitas e campos.

    Em alguns dias, Belzebu conseguiu tornar-se o único produtor de cereais de Oanylone, mas não foi o suficiente. Para gerir as suas terras, ele empregou a um preço tão baixo, que não permitia aos trabalhadores saciar a sua fome e, não tendo alternativa, estes foram forçados a aceitar estas práticas desonestas. Porém, colocou preços tão elevados que faziam o trigo e o milho tão caro, que toda a cadeia de produção sofreu uma inflação recorde. O trigo e o milho eram utilizados na composição do pão, da farinha, o milho também servia para alimentar os animais e, assim, Belzebu quase se apoderou de todo o mercado e dirigia debaixo das suas mãos a economia local. Logo o povo veio para se queixar e as autoridades vieram para manifestar a Belzebu o seu descontentamento. Este último, demasiado contente por ver que suscitava tal interesse, nem sequer se incomodou a recebê-los. O homem não deixava mais o seu domínio, deixando ao seu fiel assistente a gestão do trabalho sujo, dizendo que era demasiado importante para isso e que não se podia misturar com os da baixa Oanylone. A sua reputação dizia que o seu egoísmo só era igual à sua fortuna e que, rapidamente, cairia das nuvens. Os habitantes e os governantes decidiram reagir e criaram uma cooperativa para competir com Belzebu, os criadores deram uma parte dos seus campos para replantar os cereais e fazer descer os preços. Se Belzebu não vendesse mais, então possivelmente se dignaria a recebê-los, pensavam eles. Foi muito pior.




    O advento de um destino

    Face a tanta audácia, Belzebu foi tomado por uma cólera terrível que fez com que as paredes da sua casa tremessem. Ele ordenou ao seu fiel Astaroth que entrasse nos bairros mais pobres para recrutar os piores vilões e, assim, formar uma milícia para defender a sua propriedade. Ele pediu-lhe para levar os melhores, e com eles, ir saquear os campos, matando o gado e queimando as casas das pessoas que se juntaram à cooperativa. No dia seguinte depois de uma noite de terror, Oanylone ficou paralisada de medo perante a ideia de enfrentar aquele que tinha o poder de matar de fome toda uma população. Os camponeses não eram soldados e os milicianos de Belzebu até assustavam os guardas da cidade, e nenhum deles pôde negar a evidência da sua supremacia. Em algumas semanas, todos eles foram à sua casa para o informarem que aceitavam as suas condições, e assim, Belzebu apenas teve que impor o que era do seu agrado. Obrigou os criadores a entregarem-lhe uma percentagem das suas rendas em troca de preços aceitáveis sobre os cereais, e aqueles que se recusaram foram incapazes de alimentar correctamente os seus animais, as suas vacas e as suas ovelhas estavam tão famintas que não produziam muita carne e leite. Levou apenas alguns meses até que a fortuna de Belzebu aumentasse exponencialmente, à custa de muitos sacrifícios para o povo de Oanylone.

    Os camponeses estavam agora pobres e sem terras, os criadores ganhavam apenas o suficiente para comer, e os únicos homens saudáveis eram aqueles que tinham cedido frente a Belzebu. Os governantes deixaram-se comprar com grandes quantias de dinheiro, enquanto que os pobres morriam de fome. Num dia de inverno, Guignol e Pimpon foram à casa do seu irmão, acompanhados por muitos aldeãos, ambos estavam muito fracos, o rosto afilado, e pediram uma audiência. Belzebu concordou em ouvi-los:


    Citation:
    Guignol: Belzebu... estamos arruinados por causa de ti, não podemos nem comprar o pão de cada dia... imploramos-te que nos ajudes!

    Pimpon: Suplico-te, és nosso irmão, não podes abandonar-nos...

    Belzebu: Vocês são patéticos, não têm qualidade nenhuma e ainda se atrevem a vir pedir esmola a minha casa? Não vos darei nada, se não têm o suficiente para se alimentarem é porque são fracos. Sou rico, mas a minha fortuna pertence-me, somente a mim, e a ninguém mais.

    Guignol: Pensa no nosso pai que há muito se foi, isso foi o que te ensinou?

    Belzebu: Eu fiz-me a mim mesmo, pequenos moços! Não esperei ninguém para ser quem sou. Não vos darei o menor tostão porque vocês não merecem! Os que hoje morrem de fome, são os que não compreendem nada.

    Pimpon: Não vais parar com essa loucura? Vais deixar morrer tanta gente por causa do teu egoísmo?

    Belzebu: O meu egoísmo? Eu não sou egoísta, eu consegui e levantei ciúmes, são eles os únicos que se fecham nas suas certezas e se recusam a encarar os factos. Pela vossa falta de visão, causaram a vossa própria destruição. Vão e nunca mais voltem, se morrerem é porque merecem!


    Pimpon e Guignol deixaram o local frustrados e contaram o que lhes tinha dito o dono a outros habitantes. Todos ficaram frustrados com esse egoísmo e perceberam que nada iria mudar neste homem. Belzebu tornou-se tão poderoso que, sozinho, acumulou mais cruzados que um rei. Ele poderia distribuir dinheiro pelas janelas sem sofrer e, ainda assim, guardava tudo e não dava nada. O sofrimento do seu próximo não o afectava, não tinha nenhum amigo e, em troca, tinha mais inimigos que algum homem alguma vez tivera, em Oanylone. Foi naquele momento que o Altíssimo manifestou a sua cólera sobre Oanylone e decidiu punir aqueles que haviam pecado tanto que até haviam se esquecido do significado da vida:

    Citation:
    Jah: Enquanto vos dei o amor, vocês desviaram-se, preferindo escutar as palavras da Criatura à qual não dei Nome. Vocês preferiram abandonar-se aos prazeres mundanos em vez de me darem graças. Eu criei um lugar para vocês chamado Inferno, que eu coloquei na Lua, onde os piores dentre vós conhecerão uma eternidade de tormentos para puni-los dos seus pecados. Em sete dias, a vossa cidade será engolida pelas chamas. E aqueles que ficarem lá passarão a eternidade no Inferno. No entanto, eu sou magnânimo, e aqueles que dentre vós saibam fazer penitência passarão a eternidade no Sol, onde se encontra o Paraíso.


    Assim, um grande número de habitantes resignou-se com grande pesar a deixar aquela cidade, agora amaldiçoada.



    A rebelião

    Foi neste momento que a Criatura Sem Nome se interessou novamente por Belzebu; a primeira vez, apareceu-lhe em sonhos; mas desta vez, veio para lhe sussurrar aos ouvidos as seguintes palavras:

    Citation:
    Criatura Sem Nome: Belzzzebu..... Belzzzebu... escuta-me! Tu mostraste aos homens que eras o mais forte, tu mostraste-lhes que o fraco não tinha futuro entre os homens. Brevemente, uns homens virão e vão te fazer frente, dizendo que o amor é o que une aos homens, falarão de amizade e da cólera do Altíssimo. Não os escutes, pois são apenas mentira e malícia.


    Belzebu, que não era o que se podia chamar um crente, tinha muito pouca afinidade com os que acreditavam no Altíssimo. Os ritos legados por Oane eram-lhe desconhecidos e, na verdade, achava-os um pouco estúpidos. Seis outros homens foram abordados pela Criatura Sem Nome, cada um, como Belzebu, encarnava um vício, e todos, pregaram contra Jah. A enfrentá-los, sete virtuosos reuniram-se com a missão de defender a Palavra Divina, pregando a amizade, a temperança, a justiça, o auto-sacrifício, a conservação, o prazer e a convicção. Para ele, colocar o seu destino nas mãos de uma entidade divina não fazia sentido, só podia contar com ele mesmo e ninguém mais. Assim, ele finalmente saiu da sua casa com Astaroth a seu lado e andava pelas ruas e praças da cidade a pregar a sua verdade:

    Citation:
    Belzebu: Não escutem aqueles que dizem que o fim está próximo! Não escutem aqueles que vos fazem acreditar que Jah é Todo-Poderoso! Jah está fraco e invejoso do nosso sucesso. Jah nunca colocará em execução as Suas ameaças, porque não matará os Seus próprios filhos! Não saiam de Oanylone, continuem a viver como viviam e mandem pastar aqueles que pregam para Ele!


    Muitos foram os que o ouviram e que ouviram os outros pregadores, enquanto que Oanylone tinha caído no vício mais profundo e no pecado mais desprezível. Belzebu guardava a sua riqueza e ridicularizava aqueles que não tinham com o que viver. Rodeou-se de homens fiéis e de Astaroth, temido pela maioria daqueles com que se cruzava. A avareza que tinha mostrado não tinha igual, e aqueles que tentaram roubar os seus bens foram mortos impiedosamente. A violência foi a forma que ele encontrou para se proteger, ainda que se poderia ter cercado de um exército de homens fiéis e sinceros por amizade, mas no lugar disso envolveu-se num egoísmo tão grande que até deixou os seus irmãos morrerem de fome, quando alguns pães teriam salvo as suas vidas. A sua confiança e a sua superioridade aumentaram o eco dos argumentos retóricos contra Jah e aqueles que pregavam para Ele. Onde quer que aparecesse, o seu auditório era conquistado, e aqueles que se recusavam a ouvi-lo ou tentavam refutar os seus argumentos, ele derrotava-os impiedosamente fazendo-lhes ver apenas o seu próprio interesse.

    A cidade afundou-se completamente no vício mais absoluto, esta cidade maldita vivia assim dias negros cheios de ódio, violência e pecado. Belzebu lidava com a multidão da mesma forma como comerciava, manipulava-os com tanto êxito como geria os cruzados. No entanto, não fazia pelos outros, não; ele fazia-o por ele porque considerava que tudo o que tinha levado tanto tempo a construir, era a prova de que ele era o mais maligno, o mais rico, porque se conseguiu fazer o mais forte, e Belzebu não podia imaginar por momento algum que o seu destino era o resultado da vontade divina, ou pelo menos, que algum Deus qualquer tivesse impacto sobre ele. Segundo ele, Jah tinha deixado aos homens a escolha de não o amarem e assim, tinha deixado o futuro do mundo nas mãos da humanidade, não compreendendo porque Ele vinha agora reclamar para que O venerassem. Com os outros seis pregadores, Satanás, Belial, Azazel, Asmodeus, Lúcifer e Leviatã, Belzebu espalhava as palavras venenosas da Criatura Sem Nome com tanto fervor e tenacidade que estava confiante que nada fosse acontecer.

    Os primeiros seis dias pareceram demorar uma eternidade, o trovão ressoava e os relâmpagos caiam, e muitos resolveram deixar a cidade embora Belzebu soubesse que apenas os fracos se dobravam à vontade dos outros. Os virtuosos tinham aceite o castigo do Altíssimo e davam mais razões a Belzebu para cantar vitória porque, davam a entender que se todos os virtuosos ficavam, era porque também não acreditavam nas ameaças do Todo-Poderoso. O sétimo dia chegou e um gigantesco cataclismo ocorreu, engolindo a cidade debaixo da terra depois de tê-la purificada com as chamas da ira de Jah. Os poucos humanos que permaneceram naquele lugar foram varridos da face da terra. Aqueles que tinham escutado os virtuosos foram aceites no Paraíso enquanto que os outros foram engrossar as fileiras do Inferno Lunar. Astaroth, que permaneceu com o seu mestre, foi enviado com ele e testemunhou a punição que fora reservada para Belzebu.




    Uma eternidade de Avareza

    Belzebu foi apresentado como cada ser humano que tinha ficado em Oanylone perante Jah. Fiel a si mesmo, recusou-se a reconhecer o Todo-Poderoso e foi enviado com os seus seis companheiros, ao Inferno Lunar. A sua aparência tomou a forma do seu vício e o seu corpo deformou-se de tal forma que não se assemelhava de forma alguma a um humano. Tornou-se a avareza que encarnava em Oanylone, e tomou a forma de uma gigantesca aranha coberta de ouro, com milhares de olhos de diamante.

    Os pecadores que dão provas de avareza hoje em dia, que aproveitam os seus preceitos e que roubam os pobres para se enriquecer, esmagando outros para ter êxito e acumulando fortunas que em mil vidas não saberiam gastar, são condenados por Jah a viajarem até às galerias do Inferno para perto daquele que causou a sua perda.

    Desde então, o Príncipe-Demónio Belzebu reina sem partilhar o poder sobre as galerias e os precipícios do Inferno, e as almas condenadas que pecaram por avareza, a ele se unem para sofrerem uma eternidade de tormentos sob a sua tirania.


Traduzido do Grego pelo Monsenhor Bender.B.Rodriguez

_________________

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Adonnis
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:13 am    Sujet du message: Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Leviatã, Príncipe Demónio da Ira


    Uma infância de pesadelo

    Há muito tempo, Leto, um marinheiro honesto e trabalhador, desposou uma mulher chamada Hécate. Ela não era o protótipo da esposa amorosa e alegre digamos, ela era bastante temperamental e instável. Os anos passaram e o distanciamento de Leto, muitas vezes devido à pesca, transformou a jovem esposa numa rabugenta e antipática mulher, alguns dirão mesmo que ela era cruel e má. Sentindo-se abandonada e com pouco dinheiro, esta última passava o seu tempo livre a vender a sua virtude aos marinheiros de passagem nas docas do porto de Oanylone. Hécate ficou grávida durante uma das ausências do seu marido, e fez crer a este último que esperava um filho dele. O pobre homem nunca desconfiou e pensou simplesmente ter cumprido o seu dever conjugal.

    Assim veio ao mundo uma criança que ambos escolheram chamar de Leviatã. O pequeno, desde tenra idade, começou a mostrar as mesmas características temperamentais que a sua mãe. Com um pai vagueando sempre à mercê das marés e frequentemente ausente, a sua educação ficou a cargo de Hécate que, na sua loucura, fê-lo submeter-se a uma vida como não se deseja a ninguém. Violentado desde a mais tenra infância por ser difícil de acalmar o seu choro, insultado diariamente porque era visto como um parasita, Leviatã beneficiou de muito pouco amor mas teve que sofrer um ódio incrível durante anos. Quando ele tinha fome, a sua mãe gritava-lhe e só lhe dava o peito uma vez que a sua jornada pecadora terminasse. Leviatã chorava assim durante horas. Quando ele reclamava um pouco de amor, Hécate sacudia-o como um monte de palha para que ele cessasse de a incomodar. E se, infelizmente, tinha sujado a fralda, era deixado sujo até que o odor se tornasse tão insuportável, que Hécate acabava por o mudar. Em nenhum momento os seus anos de juventude foram agradáveis.

    Os tempos que se seguiram não foram menos horríveis para a criança, ele via muito pouco o seu pai e aproveitava esses momentos de amor que podia finalmente partilhar. Leto e Hécate não se entendiam mais, assim que gritos e bofetadas abundavam no seio da família. A fim de se proteger da sua mãe, Leviatã tinha o hábito de mentir a cada momento para não levantar suspeitas quando regressava. A fim de se vingar dos abusos que lhe infligia Hécate, desenvolvera uma astúcia incomparável, mas isso não lhe evitava contudo as sovas e outras intimidações. O jovem menino cresceu assim, vendo muito pouco aquele que amava e que considerava como seu pai. Ele via entrar legiões de homens em sua casa diariamente, insultando-o copiosamente quando a sua presença era notada. A sua mãe dissera-lhe que achava que o seu "progenitor" morrera, mas ele preferia mentir ao seu pai para manter o amor que este último lhe dava.

    Leto tinha a vã esperança de tornar o seu filho um marinheiro experiente. Assim, logo que ele alcançou a idade de partir para o mar, decidiu levá-lo com ele para a pesca. Leto mostrava-lhe todos os ossos do ofício, tudo o que fazia um bom marinheiro e ele notou rapidamente uma aptidão para esse ofício. Notou também o carácter colérico e vicioso do seu filho, o qual tentou mudar, em vão. Assim, os últimos anos da sua infância, Leviatã passou-os entre o mar e a sua mãe, entre momentos relativamente felizes e períodos trágicos. Ele tornou-se rapidamente muito dotado para a marinha e o seu pai deixou-lhe frequentemente o comando do seu navio, uma vez que Leviatã era já um grande marinheiro com a idade de quinze anos. Naquela época, o jovem adolescente era já considerado como um homem e o seu carácter impetuoso aliado aos seus acessos de raiva fazia dele um temível capitão no poder. Leto compreendeu isso muito bem e deu-lhe assim o comando de um dos seus navios de pesca.




    A juventude pecadora

    Quase em idade de brincar com as donzelas, Leviatã comandava já um belo navio de pesca com toda a sua tripulação da qual ele mesmo escolhia os membros. O jovem homem já fisicamente mais forte do que a média, arranjava marinheiros dóceis que não se rebelavam perante a sua autoridade e a sua raiva. Leviatã era tão submetido a abusos e intimidações na sua infância que contivera uma raiva por demasiado tempo. Uma noite, quando ele teve que ir para o mar, passou em sua casa para preparar os últimos detalhes da sua viagem, cruzou-se com a sua mãe, redonda como uma caçarola que o insultou abundantemente e lhe cuspiu na cara, sob o pretexto de que ele era um bastardo. Leviatã que, habitualmente, conseguia controlar-se minimamente, não pode evitar que uma terrível ira se apoderasse dele. Ele aproximou-se de Hécate e agarrou-a pelo pescoço com as suas duas mãos. Com os olhos injectados de sangue e um largo sorriso de ódio desenhado nos seus lábios, ele apertou as suas mãos gemendo, e apertou tanto que a cara da sua mãe ficou vermelho vivo com os olhos esbugalhados. Foram necessários alguns instantes para que Hécate deixasse de respirar; Leviatã deixou-a cair no chão como um saco de trigo, o seu corpo fez um baque surdo estatelando-se no chão da casa. Leviatã permaneceu assim um bom tempo a observar a sua mãe estendida no chão, não tendo nenhum remorso pelo que fizera; pelo contrário, ele sentiu-se ainda mais forte, e sobretudo, livre de um fardo demasiado pesado para os seus jovens ombros.


    [Ilustração do jovem Leviatã, autor anónimo]

    Com o ódio no seu coração e a raiva na sua alma, Leviatã estava agora incontrolável, como se o matricídio confirmasse um destino que se desenhava já depois de longos anos. Como ele planeara, embarcou numa longa semana de pesca com toda a sua tripulação, tendo deixado Hécate estendida no chão, sem dizer nada a ninguém; pensou assim que quem a encontrasse, associasse a um assassinato, perpetuado por um dos numerosos homens que vinham pagar pelos seus serviços, que se tinha sentido insatisfeito com o serviço. Ele escolhera a sua tripulação cuidadosamente; ele escolhia homens com um corpo suficientemente forte para o trabalho duro mas com uma aparência simpática. Leviatã adorava gritar com aqueles que empregava, procurando identificar o efeito que produziam os seus gritos e os seus ataques de raiva, esperando poder desencadear uma reacção para poder corrigir o insolente que ousasse enfrentá-lo. Entre os membros da tripulação encontrava-se um rapaz pouco mais jovem que ele, chamado Gabriel. Ele escolhera-o por causa da sua amabilidade e da sua aparente covardia. Disse-se a si mesmo que recrutando-o, teria de quem se divertir e saboreava já com antecedência todo o mal que seria capaz de lhe fazer. O que motivava mais o capitão nesta situação, é que não compreendia como alguém poderia ser tão calmo e tão sereno; assim, ele divertiu-se a procurar disputas regularmente e a provocá-lo.

    Um dia, ele chegou gritando como de costume, cuspindo sobre os pescadores que não eram rápidos o suficiente para seu gosto, batendo-lhes e provocando-lhes raiva e ressentimento. Frequentemente, alguns tentavam rebelar-se e atacar Leviatã, e este, feliz com o ódio que lhe consagravam, evitava sempre os golpes e batia-lhes furiosamente de seguida, com um sorriso nos lábios. Gabriel não tinha nada em que pudesse ser criticado, ele fazia bem o seu trabalho, mas Leviatã caiu-lhe em cima. Ele repreendeu-o de haver negligenciado o seu trabalho, gritando com ele para ver a sua reacção, mas Gabriel permaneceu calmo, não mostrando nem raiva nem ódio. Os insultos e os gritos de Leviatã deslizaram sobre ele como a chuva numa superfície lisa. Nada do que ele dizia o afectou nem lhe provocou a menor raiva. Desapontado com esta reacção, o capitão lançou-lhe um bom golpe e foi para outro lugar. Assim, regularmente durante as suas longas viagens no mar, Leviatã atormentava os seus homens e particularmente Gabriel contra quem desenvolveu um ódio sem precedentes, ódio que se materializou numa raiva infinita para com ele.




    O advento do ódio e da raiva

    Alguns anos se passaram, e os homens sob o jugo de Leviatã não puderam constatar um agravamento dos seus defeitos; já não contavam os pecados que tinha cometido, nem os mortos que tinham cruzado o seu caminho, e Gabriel implorava ao Altíssimo em silêncio para pará-lo. No navio, não era raro que um marinheiro fosse atirado borda fora; na sua histérica loucura, Leviatã deixou assim alguns dos seus homens afogar-se sem que ninguém pudesse fazer nada. A justiça de Oanylone não era qualificável como intransigente nesse tempo, e um bom número de acusados escapava ileso; era portanto a lei do silêncio que reinava, principalmente por medo de represálias terríveis. O ódio que emanava do homem foi indubitavelmente o que atraiu a Criatura Sem Nome a Leviatã, que se dirigiu a ele sobre a forma de tenente da guarda de Oanylone, conhecido por ser um tirano sem fé nem lei, violento e vil como nenhum outro. Uma noite, quando ele estava em terra e saía do porto, perdido nos vapores do álcool, Leviatã viu o tenente, no seu caminho, bloqueando-lhe a passagem.

    Citation:
    Leviatã: "Sai daí, se não queres sentir os meus punhos!"

    Homem: "Tem dó... Achas mesmo que serias capaz de me magoar, rapaz idiota?"

    Leviatã: "Já matei por menos que isto..."

    Homem: "Bem, bem... Tu compreendeste o poder do ódio... A tua raiva fez-te muito mais poderoso... Agora, cumpre o teu destino!"

    Leviatã: "O quê? Que destino?"

    Homem: "Leviatã, tu não entendes ainda a tua importância. Tu começas agora a descobrir o teu poder... Se juntarmos as nossas forças, poremos fim a essa mentira que é o amor e nos faremos os fortes dominadores de Oanylone!"

    Leviatã: "Palavra de honra, estás tão bêbado quanto eu..."

    Homem: "Se apenas conhecesses o verdadeiro poder da raiva... A tua mãe nunca te disse o que aconteceu com o teu pai..."

    Leviatã: "Oh, ela disse-me o suficiente! Disse-me que ele tinha sido morto!"

    Homem: "Não Leviatã, eu sou o teu pai!"

    Leviatã: "Não! Isso não é verdade... isso não é possível!"

    Homem: "Olha para o teu coração e saberás que eu digo a verdade!"

    Leviatã: "Nããããão..."

    Homem: "Agora cumpre o teu destino e mata esse usurpador que é Leto. Mais cedo ou mais tarde, ele saberá o segredo do teu nascimento e então, não terás mais ninguém."

    Leviatã: "E aí, ver-te-ei de novo?"

    Homem: "Quando Leto for eliminado e tiveres envelhecido, então, eu voltarei. Serve-te do teu ódio, jovem marinheiro, liberta a raiva e um dia encontrar-nos-emos novamente."



    A Criatura conseguira infundir ainda mais vício na alma do jovem Leviatã e as suas mentiras tornaram o capitão ainda mais arrogante e vingativo. O marinheiro estava voltado do avesso, embriagado e à mercê do pior acesso de raiva que ele tinha conhecido até então, esperou que Leto regressasse da pesca. Preparou assim a chegada daquele que pensava ser seu pai, fomentando planos para o eliminar e afiando as suas armas para melhor combater. Leviatã não tinha portanto mais nenhum sentimento para com os outros, excepto o ódio. Era o que, aliás, caracterizava este jovem. Finalmente, a grande noite chegou: Leto, cansado e desgastado pela jornada, regressou directamente sem passar pela taverna como de costume. Depois da morte da sua esposa, um alívio invadira-o e ele podia então desfrutar da sua casa, como qualquer marinheiro fazia. Ele transpôs o limiar da casa e deu de caras com Leviatã, com um sextante na mão, efervescendo e com o olhar cheio de fúria. Leto queria conversar com ele para entender o que ali se passava, mas não teve tempo. Leviatã caiu sobre ele como uma raposa sobre uma galinha e assentou-lhe um vigoroso golpe com o sextante no crânio. O sangue jorrou e deixou marcas na parede da entrada, enquanto Leto caiu morto numa poça de sangue escuro e viscoso. Nenhum grito se fez ouvir e o jovem, com trinta anos de idade, deixou lá o corpo do defunto para sair do lugar. Alguns alegaram que Leto morrera num acidente mas todos, no fundo, sabiam que havia sido um golpe de Leviatã.

    Foi assim que Leviatã herdou a fortuna do seu pai, os seus navios e se tornou almirante de uma frota de pescadores composta de uma dezena de embarcações mais ou menos importantes. Doravante, o homem não tinha nenhum limite ao seu poder, além da sua reputação pública de histérico exagerado e louco furioso, mantinha agora a de poderoso, devido à riqueza dos seus bens. Ninguém mais se ousava a opor a ele, ninguém, excepto um homem: Gabriel. A nova posição de Leviatã fez com que ele ficasse ainda mais incontrolável, liberando o seu vício sobre todos, gerando assim a cólera entre todos os seus empregados, excepto Gabriel que permaneceu firme diante dos insultos e explosões de raiva. O almirante ficou incrédulo, ele não compreendia como, apesar de toda a onda de violência que mergulhava sobre Gabriel, este podia permanecer calmo, obediente e trabalhador. O seu caminho cruzou-se com menor frequência depois disso, pois Leviatã não o escolhera para navegar a bordo do Kraken, um grande navio com três mastros que o fazia orgulhoso e lhe dava a impressão de ser o dono do mundo. Além disso, não era raro vê-lo ir para a proa e gritar que era o dono do mundo, com os braços estendidos e o olhar no horizonte, quando o vento soprava nas velas. A pesca tornara-se uma actividade fraca aos seus olhos e Leviatã decidiu lançar-se na pirataria. Ele recrutou marinheiros experientes e que não tinham medo de ir contra as leis, encontrando-os nas tavernas de má fama das docas de Oanylone, oferecendo-lhes álcool e prostitutas para os convencer a juntarem-se na sua missão destrutiva e doentia.



    [Ilustração do almirante Leviatã, autor anónimo]

    O reinado de Leviatã começou no mar de Oane que rodeava a grande cidade, ele e os seus comparsas foram assaltar os mercadores e pescadores que navegavam na costa, exibindo uma rara violência e, por motivos de segurança, nunca deixando sobreviventes. Capturando as traineiras e outras embarcações de todos os tipos, o almirante constituiu uma grande reserva de bens e mercadorias que revendia a preços de ouro nos mercados de Oanylone. Pelo caminho, ele satisfazia os seus desejos odiosos e violentos, massacrando e destruindo sem limites, deixando atrás dele centenas de cadáveres. As autoridades da cidade aperceberam-se rapidamente que a pirataria atingira as águas locais, mas como nunca ninguém tinha sido capaz de sair vivo, não tinham ideia de quem podia ser. Leviatã ainda tinha conservado a sua frota de pesca para enganar, mas alguns começaram a apontar-lhe o dedo, denunciando a quem queria ouvir que o almirante era o pirata do mar de Oane. Foi em vão e Leviatã encarregou-se ele mesmo de eliminar os acusadores, com um certo prazer por outro lado. Encontraram assim vários homens degolados em plena praça pública.

    Em cada um dos seus retornos a terra firme, Leviatã reencontrava indubitavelmente Gabriel, talvez porque a sua história estava ligada num destino comum. Este último procurava sempre chamar à razão o marinheiro irascível, explicando-lhe que o seu vício ia lançá-lo no abismo. As suas conversas terminavam geralmente da mesma forma, por uma grande bofetada na cara de Gabriel. Um observador exterior relatou uma delas que seria mais ou menos isto:


    Citation:
    Gabriel: "Leviatã! Por quê tanto ódio?"

    Leviatã: "Porque em toda a Humanidade rapaz, existem apenas dois tipos de homens e somente dois. Aqueles que ficam no sítio onde deveriam estar e aqueles que têm o seu pé no rosto do outro!"

    Gabriel: "Meu Jah, mas que horror! O que viveste para cultivar tanto ódio e raiva para com os outros?"

    Leviatã: "Tu vais deixar-me ir, certo? Tu ainda vais levar outra vez uma bofetada na cara..."

    Gabriel: "Tu sabes, eu não tenho medo das tuas ameaças e os teus golpes nunca me farão reagir! Abomino a violência porque ela é a mãe do sofrimento!"

    Leviatã: "Mas isso não é verdade! Nunca te ensinaram a calares a boca? Deveria assar-te como um porco, e à tua família também, para que deixes de me irritar? "

    Gabriel: "Eu nunca pararia, pelo menos até que decidas, finalmente mudar!"

    Leviatã: "Eu jamais mudaria, eu nunca me deixaria pisar por um fraco como tu! E desta vez vais levar a tua bofetada!"



    Assim ia a vida de dois seres que, sem o saber, estavam ligados pelo futuro numa louca missão, própria de cada um. Gabriel nunca desistiu da ideia de remeter Leviatã ao caminho correcto e isso só fez piorar o desdém que este último lhe devotava. O carácter psicopata de Leviatã era de conhecimento público, de modo que a maioria das pessoas que conheciam o par infernal se perguntava quando Leviatã mataria Gabriel, mas alguns pensadores declararam com inteligência que o almirante nunca eliminaria o virtuoso, porque sem ele, não teria mais nenhuma razão para viver.

    Um belo dia, Leviatã, cada vez mais intrigado com a temperança de Gabriel, fê-lo vir a si. Quando este chegou, viu o seu pai, Vorian, amarrado a um pilar de madeira. O odioso marinheiro disse-lhe que o seu pai tinha perdido todo um carregamento de peixes, que era um mau elemento e que merecia uma correcção. Leviatã começou então a bater em Vorian, Gabriel suplicou-lhe para parar, mas quanto mais suplicava, mais Leviatã lhe batia. Ele bateu-lhe com tanta força que trespassou o ventre de Vorian numa explosão de sangue. Este último morreu imediatamente, acompanhado das lágrimas do seu filho. Leviatã esperava que Gabriel reagisse e, louco de raiva, tentasse vingar o seu pai, mas ele não fez nada, virou-lhe as coisas e saiu do local, dizendo ao assassino que o ódio e a raiva não o atingiam e que o seu fim estava próximo. Ele acrescentou que Jah puniria Leviatã pelos seus pecados e que seria condenado a uma eternidade de sofrimento. Desta vez, ele não deu a Leviatã tempo de responder, saiu como uma alma perdida, e o almirante perguntou-se então o que deveria fazer para que o seu eterno adversário dignasse enfim a dar-lhe razão, batendo-lhe.

    Assim, durante longos anos intercalaram-se períodos de violência e ódio, homicídio e assassinato sem fundamento. O prazer que proporcionava a Leviatã matar e responder aos seus acessos coléricos tornou-se cada vez mais intenso. Ele não reencontrou mais Gabriel durante muito tempo, mas cultivou contra ele um desdém sem comparação, com o que ele podia ter sentido até aqui. Os actos de pirataria do almirante tornaram-se lenda no mar de Oane e a sua reputação era tão grande que vinham pagar-lhe para que poupasse um navio. Ele abandonou de uma vez por todas a pesca, e transformou a sua frota de barcos em equipas de piratas ao seu serviço, enfrentando o mar contra ventos e marés por sua conta.




    A punição de Jah

    Oanylone afundara-se no vício e no pecado. O ódio, a guerra e a violência apareceram e os homens esqueceram definitivamente o amor do Altíssimo, todos salvo sete virtuosos que tinham sempre pregado o amor de Jah e o amor ao próximo, cada um com a sua própria virtude. A cidade tornara-se um verdadeiro inferno onde os fortes e os fracos se matavam pelo poder. A Criatura Sem Nome estava então encantada e preparava a sua vingança contra o Altíssimo, provando-lhe pelos actos dos mortais que a sua resposta era a correcta. Mas Jah, mesmo sendo Ele o amor, estava longe de ser idiota. Ele não fizera dos homens Seus filhos para que eles se comportassem daquela forma, nem lhes subordinara as outras espécies, nem lhes tinha deixado a liberdade de escolherem o seu destino para se destruírem uns aos outros, de tal forma que tomou a decisão de punir os humanos que habitavam em Oanylone, o berço da civilização. Ele decretou que engoliria a cidade nos abismos da terra e nos fogos da punição divina depois de sete dias. Na Sua benignidade eterna, acrescentou que todos aqueles que partissem seriam poupados e aqueles que tivessem feito penitência seriam admitidos com Ele no Paraíso.

    A Criatura Sem Nome decidiu então regressar para perto de Leviatã porque na memória dos homens, nunca ninguém mostrara tanta cólera nem manifestado tanto ódio pelo próximo. A Criatura pensou que com aquele homem, poderia convencer uma grande quantidade de pessoas a participar do sentido que dava à vida humana. Foi sobre a forma de tenente que regressou para perto do sanguinário homem, pedindo-lhe para pregar a raiva. Leviatã, que vivera através da violência e da loucura aceitou, pois estava plenamente de acordo com o facto que o forte dominava o fraco e que assim deveria ser sempre. Para ele, o amor estava reservado para os fracos. O almirante, como outros seis homens, decidiu espalhar a mensagem da Criatura à qual Jah não dera nome. Assim, atracou no porto de Oanylone pela última vez e desembarcou para pregar a raiva. Aqui está um trecho extraído de um dos sermões do almirante Leviatã, relatado por um sobrevivente de Oanylone que deixou a cidade amaldiçoada no sexto dia:


    Citation:
    Leviatã: "O caminho dos homens está semeado de obstáculos que são os empreendimentos altruístas que fazem, sem fim, surgir a obra dos virtuosos. Bem-aventurado o homem de boa vontade que, em nome da cólera, se faz o pastor dos fortes que guia no vale da sombra da morte e das lágrimas, porque ele é o guardião do seu irmão e o salvador dos filhos perdidos. Abaterei o meu braço de uma terrível cólera, de uma vingança furiosa e horrorosa sobre as hordas ímpias que pregam e espalham a mensagem de Jah. E saberás porque o meu nome é Almirante quando sobre ti se abater a vingança do pescador!"



    Seis dias se passaram no dilúvio, na tempestade, no granizo e no vento, numerosos foram aqueles que deixaram esta cidade maldita que se tornara Oanylone com a esperança de sobreviver ao Apocalipse que ia acontecer. Mas Leviatã ficou, convencido que ele estava certo e que o amor não era o sentido da vida. Ele pregou uma e outra vez, afirmando que o forte dominava o fraco e declarou constantemente que a cólera e o ódio eram motivações salvadores quando utilizadas como ele fazia. O almirante estava convencido que Jah não mataria as suas próprias criaturas, porque Ele era fraco e, segundo ele, havia-o provado deixando aos homens o livre-arbítrio. Ele incutiu nos corações malvados a ideia de que, se Jah fosse forte, estaria com raiva e vingança em vez de amor e temperança. Leviatã citava o exemplo de Gabriel que perdia, segundo ele, o seu tempo a pregar a amizade, o amor e provava pelas suas acções a sua falta de coragem. Muitos ouviram com interesse as propostas do marinheiro, e muitos o seguiram no seu louco empreendimento e mataram aqueles que recusavam escutar Leviatã. Muitos foram os que passaram da vida à morte durante estes seis longos dias. Mas, durante um sermão bem sucedido que ele declamava no porto de Oanylone, um homem, o almirante Alcisde, veio tentar silenciar Leviatã. O homem era um amigo próximo de Gabriel e contava, provavelmente, reparar anos de injustiça. Ele preparara com o seu amigo a evacuação de um grande número de cidadãos por via marítima. Leviatã, louco de raiva e cólera ao ser interrompido, lançou uma enorme viga de madeira sobre o navio imobilizando-o cheio de homens e mulheres. Todos iam assim perecer com Oanylone. Leviatã testemunhou a façanha de Gabriel, que salvou o barco e viu os sobreviventes a gritarem vivas à atenção deste último. Isso colocou-o num estado de raiva ainda mais insano, mas decidiu ir-se embora em vez de intervir contra Gabriel.

    Veio então o sétimo dia, o último dia de Oanylone, que ia afundar-se no esquecimento e nem permaneceria na memória dos homens, somente através de histórias sagradas. A terra começou a tremer e brechas escancaradas abriram-se em todos os lugares, chamas infernais emergiram das profundezas da terra e queimaram a cidade. Leviatã decidira no entanto fugir da urbe e embarcara no último momento sobre o Kraken, o seu navio mais rápido. Ele pensou escapar à ira do Altíssimo navegando para o mar. Foi ali que cruzou uma última vez o olhar com Gabriel que permanecia sobre o porto, Leviatã pensou que Gabriel estava louco por acreditar naquele momento no Todo-Poderoso e não entendeu porque ele decidira deixar-se levar com a cidade. Navegando a um ritmo rápido e distanciando-se do porto, Leviatã acreditava-se fora de perigo, mas os elementos ficaram enlouquecidos e um vórtice terrível formou-se à volta do Kraken que acabou por engoli-lo. Finalmente chegou ao fim a história de Oanylone, que desapareceu no abismo levada pelas chamas purificadoras da ira do Altíssimo.




    Uma eternidade de cólera

    Leviatã, tal como os seis homens que pregavam para a Criatura Sem Nome, e como todos aqueles que permaneceram em Oanylone, pecadores ou virtuosos, foram conduzidos perante o Altíssimo. Mesmo nesse instante a sua cólera não diminuíra; os seus olhos incandescentes e estriados de veias não mostravam nenhum apaziguamento e a sua punição foi terrível. Ele tinha encarnado tanta raiva que Jah o enviou para o Inferno Lunar com o título de Príncipe Demónio, transformando o seu corpo de modo que se tornasse no pecado através do qual tinha vivido. Assim, Leviatã tomou a forma de um enorme touro musculoso com os olhos injectados de sangue, soprando chamas pelas narinas. Foi condenado a passar uma eternidade nas planícies do inferno.


    [Ilustração do Príncipe Demónio Leviatã
    Segundo as indicações de Sypous, autor anónimo]

    No Julgamento Final, os mortais apresentam-se a Jah. Conforme os actos, as palavras e os pensamentos que eles tiveram durante a sua existência terrestre e em função do caminho que escolheram, são enviados a sofrer uma eternidade de tormentos ao serviço dos Príncipes Demónios ou a viver uma eternidade de prazer ao lado dos Arcanjos. Aqueles que pecaram pela raiva e se abandonaram ao ódio pelo próximo, matando e espalhando a desgraça, aqueles que tentaram com todas as suas forças lutar contra a sua condição, vêm juntar-se às fileiras de Leviatã, Príncipe Demónio da Ira.



Traduzido do Grego pelo Monsenhor Bender.B.Rodriguez

_________________

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Adonnis
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:13 am    Sujet du message: Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Lúcifer, Príncipe-Demónio da Preguiça



    A vinda ao mundo de uma criança ideal

    Há muito tempo, numa pequena vila situada a alguns quilómetros a sul de Oanylone, de uma esposa e um marido preenchidos, felizes no amor e que se contentavam com o pouco que tinham, nasceu um pequeno bebé a que chamaram Lúcifer. Ambos os pais, Lúcia e Fernando viviam em felicidade, não nadavam em ouro, mas o produto do seu gado era o suficiente para os alimentar. Eles sempre quiseram ter um filho e, naquele dia memorável de alegria, todos os seus desejos foram satisfeitos. Foi assim que Lúcifer que começou a sua vida, no amor mais querido e sob a protecção de dois pais carinhosos e muito dedicados do seu cuidado.

    Lúcifer crescia demasiado depressa para o gosto dos seus pais, mas nada podia perturbar o perfeito equilíbrio familiar que começou com a sua chegada e Fernando não deixava de louvar a gentileza e benevolência do seu filho. Lúcia não poupava elogios quanto às suas capacidades e delicadeza. O seu pai e a sua mãe estavam tão orgulhosos de ter trazido ao mundo este menino tão sábio, tão amoroso que nunca deixavam de se maravilhar com ele. Foi quando ele chegou à adolescência que compreenderam que Lúcifer estava reservado a um grande destino.

    Os jovens amigos de Lúcifer queriam sempre passar o tempo com ele, era uma boa companhia e tinha a confiança de muitos. Recebia sempre elogios daqueles que conhecia e os seus pais tinham poupado até ao último centavo para lhe permitir uma educação correcta. Fernando sempre disse que não queria que o seu filho fosse um simples camponês e mantinha os sonhos mais doces em respeito a ele. Lúcia compartilhava a mesma visão e ambos deram o que tinham pelo seu filho. Lúcifer era honesto, era realmente bom, condescendente e um verdadeiro amigo, ele colocava em prática todo o amor que tinha recebido dos outros. Um nobre cavaleiro, Calistan, que governava um domínio longe da aldeia ouviu falar sobre essa criança tão bem descrita por rumores. Ele decidiu encontrá-lo e certificar-se que não lhe tinham contado fantasias. Em toda a aldeia ele interrogou os moradores e todos responderam a mesma coisa:


    Citation:
    Aldeãos: Lúcifer o bom? Você o reconhecerá, é um belo e jovem homem com um olhar benevolente. Você pode ficar aqui, meu senhor.


    O valente cavaleiro não tardou a cruzar-se com o olhar cheio de amor do jovem rapaz, não teve que lhe perguntar se era Lúcifer porque os olhos do menino faziam jus à sua reputação. Ele sugeriu que fossem juntos ao encontro de seus pais, porque desejava-lhe oferecer um belo futuro. Calistan explicou a Lúcifer que tinha procurado durante muito tempo por um jovem escudeiro, ele queria-o justo e corajoso, bom e honesto; e a reputação do jovem rapaz tinha-o atraído até ali. Assim, propôs a Fernando e a Lúcia levar com ele o jovem adolescente e ensinar-lhe a cavalaria, ao que todos os três concordam sem pestanejar.



    A aprendizagem da virtude e da fé

    Lúcifer acompanhou o cavaleiro ao seu domínio para uma aprendizagem que durou vários anos. Numa cerimónia liderada pelo seu guia espiritual, foi nomeado escudeiro e comprometeu-se a servir o seu novo mestre, respeitando os valores da cavalaria e vivendo sempre na virtude. Calistan propôs-se fazer daquele jovem rapaz um grande cavaleiro e, para começar, falou-lhe de Oane:

    Citation:
    Calistan: Meu jovem amigo, tu conheces Oane?

    Lúcifer: Ele foi o fundador da grande cidade de Oanylone, certo?

    Calistan: Não foi somente isso meu amigo, foi uma grande figura do nosso mundo porque é graças a ele que temos uma alma! Vou contar-te a sua história...


    E Calistan contou-lhe a história dos homens, como se sentiam abandonados por Jah e como se sentiam privados de talento, como se consideravam marginalizados por causa da inferioridade da qual se imaginavam vítimas. Contou como Jah reuniu as suas criações e a pergunta que lhes colocou. Ele explicou como uma criatura se chegou à frente e deu a sua resposta, então, Jah ordenou a Oane que lhe desse outra. Finalmente, o cavaleiro revelou-lhe quais foram as palavras de Oane que nos deram o estatuto de filhos do Altíssimo. Lúcifer ficou sem palavras diante deste homem que conseguiu compreender o mundo, ele mesmo compartilhava essa visão desde há muito tempo. Ele nunca tinha compreendido do que se tratava, mas Lúcifer estava certo que, agora, tinha encontrado as palavras para descobrir como se sentia. Calistan então contou-lhe como Oane, agora líder espiritual, conduziu os homens por uma grande planície, durante muitos anos de viagem. Seguiu essa história descrevendo a morte de Oane e a aceitação que tinha tido, terminando com a criação de Oanylone e o culto consagrado a Oane por aqueles que veneravam o Altíssimo. Lúcifer ficou tão encantado e tocado que procurou aprofundar o seu conhecimento de Oane e dos primórdios da humanidade por muitos anos, além do seu trabalho como escudeiro de servir o cavaleiro.

    O jovem escudeiro mantinha uma servidão impecável, com respeito a Calistan e nunca criava dificuldades, não apenas para lhe ceder o lugar de honra em todos os lugares, mas também para lhe obedecer ou para lhe levar o seu escudo. Esta grande subordinação permitia-lhe abraçar o desejo de fazer-se digno da cavalaria, pelas suas acções de valor e boa conduta, mas também pela virtude, essencial para se tornar um cavaleiro perfeito. Lúcifer venerava o Altíssimo e partilhava esta devoção com o seu cavaleiro e, ao mesmo tempo que compreendia o sentido da vida e rezava com fervor, ele também treinava o combate e o uso de armas. A sua aprendizagem foi longa e difícil, durante mais de sete anos ele trabalhou com afinco, comportou-se como um perfeito cavaleiro e, para todos os seus professores, ele era um aluno talentoso. Um dia, enquanto conversava com o seu mestre, ele perguntou-lhe:


    Citation:
    Lúcifer: Mestre, se o sentido da vida é o amor e se nós somos todos iguais perante o Altíssimo, porque nós treinamos para combater? Não deveríamos explicar a vontade de Jah? Partilhar o nosso amor em todas as circunstâncias?

    Calistan: Meu jovem escudeiro, Jah ama-nos e nós O amamos, mas Ele deu-nos a opção de compreendermos isso, e portanto, de negar este estado de amor! Ele também deixou conosco a Criatura que deu a primeira resposta com o fim de nos tentar e de nos permitir fazer uma escolha livre. Assim, muitos, infelizmente, seguem os preceitos desta infame Criatura.

    Lúcifer: Mas, neste caso, não nos deveríamos contentar em matar a Criatura?

    Calistan: Não, meu jovem escudeiro, a morte seria desrespeitar a vontade de Jah e acima de tudo isso, seria impor o amor do Altíssimo pela força. É indispensável para compreender que Ele nos ama e a quem nós devemos amar de volta.


    Ambos conversaram assim e Calistan explicou porque o cavaleiro deve defender a justiça, a honra e a bravura, e fez-lhe compreender que um verdadeiro e valente cavaleiro deve proteger os fracos e torcer o pescoço da injustiça. Assim, eles discutiam mais e mais e durante todo o tempo que Lúcifer acompanhou o seu mestre. Para terminar a sua formação, depois de dez longos anos de aprendizagem no cargo de escudeiro ao serviço do cavaleiro, este último levou-o a léguas do seu domínio para ver a cidade de Oanylone que tanto tinham falado. O jovem homem estava longe de imaginar o que Calistan lhe tinha reservado.



    A cavalaria e a glória de Jah

    Calistan e Lúcifer cavalgaram até ao sopé da cidade de Oanylone, já bastante contaminada pelo vício e o pecado. Se o cavaleiro tinha contado a história desta cidade, ele não se tinha esquecido de esclarecer o que ela se tornou e como os vilões e outros bandidos tinham o poder de lei por vezes. Lúcifer permaneceu maravilhado com a imponente cidade, os seus olhos ficaram impressionados pelo símbolo que representava e sentiu no fundo de si a inveja de devolver a este lugar o seu esplendor lendário.

    Calistan levou assim Lúcifer até ao túmulo de Oane e, perante aqueles que antigamente faziam de sacerdotes, começou uma grande cerimónia. O cavaleiro considerou naquele dia que não tinha nada mais para ensinar ao jovem homem tornado razão e força. Lúcifer, no alto dos seus vinte e cinco anos, foi assim nomeado cavaleiro por Calistan. Este último ofereceu-lhe as terras que possuía em Oanylone e um pecúlio considerável com a missão de corrigir os erros desta cidade com o passado tão brilhante. Lúcifer sentiu-se então investido de uma missão divina e, pela primeira vez, orgulhoso do que tinha alcançado até agora.




    O cavaleiro Lúcifer instalou a sua fortaleza no domínio que lhe foi dado, ele pregou na cidade para encontrar homens e mulheres que quisessem acompanhá-lo na sua vontade de melhorar a imagem de Oanylone. A sua presença e as suas grandes qualidades, juntas com a sua virtude e a sua fé, permitiram-lhe convencer muitas mais almas do que pensava. Lúcifer fundou assim a Ordem dos Justos de Oane e propôs-se defender a justiça, de proteger os fracos e de combater a miséria por todos os meios que ele dispunha. Em alguns meses, tornou-se uma figura central da cidade, assustando os ladrões e provocando a admiração dos poderosos. Foi recebido pelos governantes de Oanylone que lhe deram carta branca para que corrigisse as injustiças. Os seus homens espalhavam a história de Oane e explicavam o sentido da vida enquanto que ele, armado da sua coragem, lutava para fazer melhores os homens maus com que se cruzava. Lúcifer jamais deu provas de violência imprudente, ele lutava só em último recurso e unicamente para se defender ou defender o fraco contra o mais forte. Ele teve o cuidado de não fazer justiça por ele mesmo e trabalhar em conjunto com as autoridades de Oanylone, assegurando-se que a justiça fosse dignamente prestada.

    Em apenas cinco anos, a Ordem dos Justos de Oane tornou-se indispensável por todo o Reino e os homens que se uniram a Lúcifer partilhavam todos da mesma fé e do mesmo código de honra, ele mesmo investiu cinco cavaleiros e, em toda a comunidade, os Justos eram amigos de verdade. Calistan vinha visitá-lo regularmente e estava orgulhoso do que tinha alcançado o seu antigo escudeiro. Os seus pais foram também atingidos pelo destino do filho mas, apesar da sua insistência, recusaram-se a vir viver no seu domínio. Eles explicaram-lhe que deveriam de trabalhar porque Jah lhes deu a terra e que aproveitar a ociosidade não lhes traria felicidade. Lúcifer, com pesar, compreendeu a sua decisão e ficou feliz de os acolher cada vez que eles quisessem. A cidade de Oanylone parecia curar os seus males e os Justos eram temidos e respeitados. Glorificavam a Jah e levaram os homens a ver o amor que Jah tinha por eles, não pela força mas pelas suas acções e pelas suas palavras. O culto do Altíssimo nunca foi tão forte em Oanylone, excepto depois da morte de Oane.

    Inevitavelmente, nestes tempos cheios dos mesmos problemas, Lúcifer atiçou o ódio e o espírito de vingança. Numerosos eram os que se corrompiam nas prisões da cidade pelo simples acto do Cavaleiro. Os ricos e os gananciosos começaram a vê-lo como uma ameaça, pensando que ele acabaria por procurar governar Oanylone em vez deles. Aqueles que pecavam e espalhavam o vício também se sentiam ameaçados. Os corrompidos e os grandes ladrões sabiam que não podiam viver dos seus crimes enquanto a Ordem dos Justos reinasse como mestre sobre a cidade e eles conheciam a razão de tudo isso: Lúcifer o bom... assim eles reagruparam-se e decidiram fazer desaparecer este incómodo cavaleiro.




    O insuportável sofrimento e a tentação

    Os poderosos e os ricos com medo, sob a influência da tentação e do pecado, financiaram então os meliantes mais vis de Oanylone com o único fim de reduzir Lúcifer ao silêncio. Eles sabiam que não podiam atacá-lo directamente pelo risco de o converterem num mártir e de tornar o culto de Jah ainda mais forte. Assim, eles atacaram todos aqueles em quem Lúcifer acreditava. Um pequeno exército foi criado afim de atacar a vila natal do cavaleiro. Os habitantes daquele lugar foram espancados e magoados na sua carne de modo que Lúcifer se entregou para restabelecer a paz na pequena vila. Ele foi então para lá com os seus cavaleiros para combater aqueles que tinham trazido o ódio e a violência. Foi no caminho que levava ao combate que um mensageiro veio até ele e lhe anunciou a morte dos seus pais e dos amigos mais próximos, todos queimados vivos. Dilacerado pela tristeza, o Justo e os seus lutaram contra o mal vitoriosamente durante alguns dias, mas o sofrimento que tinha dentro de si não desaparecera.

    Durante estes dias, os outros começaram a atacar os guias espirituais que pregavam o amor do Altíssimo, submetendo-os a espancamentos e torturas sem que ninguém se pudesse opor a eles. Os meliantes tinham que ocupar-se em atacar com força a Ordem dos Justos de Oane e quando Lúcifer e os cavaleiros regressaram, as notícias foram igualmente dramáticas. Quase todos os guias tinham sido assassinados e a multidão que os escutava regularmente estava aterrorizada e não compreendia porque Jah não interveio em seu favor. Seguiram-se semanas de terror, a violência e o assassinato acompanhavam agora cada aparição pública dos cavaleiros e dos guias, até que a população começou a pensar que os Justos foram amaldiçoados. O empreendimento vil fomentado por aqueles que temiam Lúcifer continuou inabalável, Calistan e a sua família foram massacrados, o seu domínio queimado e os seus filhos espancados até à morte. Lúcifer estava cada vez mais desapontado e, lentamente, começou a definhar no mais terrível tormento.

    Tudo isso não foi suficiente para mudar o homem que continuava a acreditar que o amor poderia triunfar sobre todo este ódio e toda esta violência. Assim, os conspiradores decidiram dar-lhe o golpe de misericórdia e organizaram-se para matar os seus cavaleiros. Todos sofreram finais horríveis, os seus corpos mutilados e sem vida foram encontrados pendurados nos quatro cantos de Oanylone. Foi quando Lúcifer encontrou a Criatura Sem Nome, atraída por todo este sofrimento e esses sentimentos enterrados no fundo de uma alma torturada. A Criatura tomou a forma de um espírito e foi para o túmulo de Oane onde Lúcifer tentava apaziguar o seu sofrimento moral. O encontro foi breve.


    Citation:
    Espírito: Jovem cavaleiro, ouvi a tua história horrível, o rumor diz que todos que aqueles que tu amavas foram assassinados.

    Lúcifer: Quem és tu?

    Espírito: Quem sou eu? Eu sou aquele que está deitado neste túmulo, aquele que fez construir esta cidade.

    Lúcifer: Oane? Tu és Oane? Como isto é possível...

    Espírito: Meu jovem amigo, nada é impossível para aquele que encontraram A resposta. Se eu vim é para te colocar uma pergunta. Tu vais deixar estas horríveis atrocidades impunes?

    Lúcifer: Eu não quero falar sobre isso, a minha alma está rasgada e as minhas noites são feitas de pesadelos e lágrimas. Eu não sei a que mais me agarrar para sobreviver a tanto ódio.

    Espírito: A justiça de Oanylone jamais será suficientemente severa para apaziguar o teu coração e a tua alma. De todos os homens que eu conheci, jamais me havia cruzado com um trajado com um olhar tão triste. Procura no fundo de ti mesmo, verás que deves fazer justiça, e somente depois de matares o último assassino dos teus, o teu sofrimento será aliviado...


    O bom cavaleiro abandonou-se então à vingança, e o ódio possuía o seu coração. Ele tinha sofrido tanta dor e miséria e sucumbiu à cólera de não ter sido capaz de proteger os seus, de não ter sido capaz de salvar a sua família. Com imensa violência, ele lutou para encontrar os culpados e massacrou-os um a um mas somente aqueles que haviam sido culpados das atrocidades foram assassinados, aqueles que tinham financiado e fomentado esses projectos escaparam à triste sorte dos seus mercenários. No entanto, depois disso, Lúcifer não se havia apaziguado; pelo contrário, a sua sentença, misturado com os horrores que cometeu, fez-lhe ainda pior.

    Assim, para completar o seu trabalho destrutivo e pecador, os poderosos proprietários corruptos decidiram um último complô que foi montado contra Lúcifer em pessoa. Entretanto, o cavaleiro que defendia a virtude, a fé, a justiça e a bravura, massacrava apressadamente aqueles que ele mesmo havia condenado. Juízes corruptos apresentaram-se no seu domínio e acusaram-no de ter causado a morte sem justiça, de espalhar o ódio e de ter morto cegamente. Lúcifer, já nas profundezas do sofrimento humano foi então lançado à mercê da multidão, demasiado contente de ver que um herói tão invejado era apenas um bandido vil. Foi assim arrastado pela lama e no opróbrio, acusado de todos os males e de todos os vícios. Num julgamento público, a sentença foi exemplar e pesada para o cavaleiro acusado de usurpar a sua reputação, a sua Ordem foi desmantelada, os seus guias foram executados publicamente e os seus amigos foram banidos de Oanylone. Quanto a Lúcifer, depois de numerosos dias de tortura, foi destituído do seu título de cavaleiro, as suas terras foram apreendidas e ele foi atirado para a prisão da cidade para definhar ali até à sua morte.




    A decadência espiritual

    Na sua cela, Lúcifer, magoado, decepcionado, abatido e no mais fundo que a alma humana podia suportar chorou por dias e dias. Ele não conseguia compreender como tudo isso tinha acontecido e sentiu-se abandonado pelo Todo Poderoso. Ele perguntava-se como Jah, que era puro Amor aos seus olhos, pôde deixar que tais coisas acontecessem. De novo, a Criatura Sem Nome foi fortemente atraída por este calvário e, desta vez, utilizou outro truque para falar com ele. A Criatura soprou a sua alma num prisioneiro de uma cela próxima de Lúcifer.

    Citation:
    Criatura: Pára de choramingar como uma menina!

    Lúcifer: ...Deixa-me...

    Criatura: Eu não tenho que suportar isto, há demasiado tempo que definho aqui por ter pregado o amor do Todo Poderoso!

    Lúcifer: Tu és um guia? Queres rezar comigo?

    Criatura: Não há nenhuma oração que Jah escute, ele deixou-nos há muito tempo.

    Lúcifer: Não... Jah deixou-nos o livre-arbítrio...

    Criatura: Não, ele abandonou-nos. Contaram-me a tua história e ela é a última prova!

    Lúcifer: O que queres tu dizer?

    Criatura: Tu tornaste-te um dos cavaleiros mais poderosos que Oanylone já conheceu, tu protegeste os fracos e combateste as injustiças e vê até onde isso te levou! Todos os teus parentes foram mortos, tudo aquilo em que acreditavas se afundou. Precisas de mais provas para compreenderes que o Amor é uma ilusão? Fizeste uso da força e vingaste os teus e no entanto, estás aliviado? Não há justiça, não há amor, os mais fortes que tu dominaram-te. Essa é a única realidade do nosso mundo e o único motor que nos deve fazer avançar...


    Durante aquela noite, a Criatura matou o prisioneiro em atrozes sofrimentos e Lúcifer assistiu mais uma vez ao que ele considerava doravante como o abandono de Jah. Os dias passaram, logo as semanas transformaram-se em meses e os meses fizeram-se anos, de modo que Lúcifer atingiu a idade de quarenta e quatro anos na prisão e sempre preso a uma indizível pena. À medida que o tempo passava, a sua Fé havia-o deixado totalmente, ele não acreditava mais no Amor do Altíssimo e o seu corpo transformou-se. Os seus músculos protuberantes tornaram-se secos e as suas orações a Jah deram espaço a sestas sem sonhos. A sede de conhecimento que o havia animado tinha secado e nada mais animava o homem que fora um valente cavaleiro. Ainda que estivesse condenado a permanecer preso até ao seu fim, Lúcifer foi perdoado e libertado por alguns homens movido pelo destino que lhe estava reservado. Eles deram-lhe um pequeno pedaço de terra cultivável e dinheiro suficiente para viver até ao seu último suspiro.

    Cansado da vida e insatisfeito, Lúcifer contratou alguns funcionários para se ocuparem em lhe dar o conforto que ele não tinha. Não cultivou as suas terras e passou os seus dias lamentando-se do seu infortúnio. A ociosidade invadiu-o assim e Lúcifer não fez mais nada além de dormir e comer, não tinha um minuto que perder por não fazer nada. Os antigos ouvintes das suas pregações fervorosas vieram vê-lo, e todos ficaram surpreendidos ao vê-lo assim. Lúcifer, durante meses tinha comido mais do que se tinha movido, ficando assim gordo e nada gracioso. Os homens tentaram compreender e o mais velho adiantou-se:


    Citation:
    Ancião: Senhor Lúcifer, porque tu não pregas mais? Aqueles que te magoaram estão mortos ou partiram.

    Lúcifer: Pregar? Não há nada para pregar. Jah não nos ama e temos de nos perguntar se Ele existe. A fé é uma ilusão que inventámos para não temer a morte. Não há sentido na vida. Não há prazer para os homens excepto o de não fazer nada. A vida não é um caminho que nós escolhemos sem dominar qualquer coisa.

    Ancião: Lúcifer, tu queres orar mas o teu coração não sabe mais oração. Fria é a preguiça que cobre o teu corpo, és apenas uma estátua de mármore sentada na tua própria sepultura.


    Os anciãos ficaram horrorizados ao ouvir sobre Lúcifer e de ver a preguiça à qual se tinha abandonado. Lúcifer viveu assim por mais dez anos, sem ter interesse por nada, ignorando totalmente os prazeres da vida e renegando a fé que o tinha animado antigamente. Para aqueles que tentaram convencê-lo a recuperar o gosto pela vida, ele dava-lhes o mesmo discurso e todos eles puderam constatar que o homem não era mais que a sombra de uma alma, um corpo vivo sem iluminação.

    Naquele tempo, Oanylone conheceu um período movimentado e agitado pela turbulência do vício e da escória dos pecados. O ódio e a violência apoderaram-se de toda a cidade, a preguiça venceu os trabalhadores que preferiram os bens materiais aos bens espirituais, a ociosidade venceu em todos os níveis da sociedade de Oanylone, de modo que Lúcifer foi novamente tratado como um exemplo e elevado ao nível de mito. A sua atitude preguiçosa e ociosa espalhou-se rapidamente no seio da cloaca em que se tornara a cidade, e um verdadeiro culto foi dedicado a ele. Os burgueses e os ricos também se entregaram à preguiça, fazendo os outros trabalhar para eles e, como Lúcifer, começaram a não acreditar em nada. Os pecados da preguiça, gula, avareza, ira, inveja, orgulho e luxúria apoderaram-se de Oanylone. A Criatura Sem Nome, que rondava entre os homens, injectava o seu veneno nos corações dos fracos que se voltaram contra os fortes, de modo que a guerra começou e a violência, o assassinato e o ódio converteram-se no que guiava a cidade. Foi então que o Altíssimo falou aos homens e lhes lançou um ultimato. Ele deu sete dias aos humanos para deixaram Oanylone. De outra forma, todos os presentes seriam destruídos com a cidade. Numerosos foram aqueles que deixaram sem demora a cidade maldita, mas numerosos foram aqueles que ficaram.

    A Criatura apareceu uma última vez a Lúcifer e convenceu-o a espalhar a sua mensagem apelando à preguiça. Ele pregou entre os indivíduos mais vis que podia encontrar-se em Oanylone, sendo ouvido muito mais que no passado, quando transmitia uma mensagem virtuosa cheia de amor. Pouco a pouco, todos perderam rapidamente o gosto pela vida e cederam a uma preguiça sem limite. Eles vieram ouvi-lo pregar de novo na sua própria casa, contra qualquer forma de actividade e de espiritualidade. Os numerosos homens assistiram às suas diatribes furiosas contra o Altíssimo, defendendo a preguiça. Lúcifer tinha escrito preceitos, seis que até à data foram encontrados:


    Citation:
    Primeiro preceito: Não faças o que alguém pode fazer por ti, seria uma pena perder a tua própria existência gasta no trabalho.

    Segundo preceito: Não há necessidade de se perder em orações e meditações já que o descanso do sono alimenta tanto ou mais o espírito do homem.

    Terceiro preceito: Crer numa busca espiritual e religiosa é ilusório, porque o homem está intrinsecamente consagrado ao pecado. Por natureza é perverso e, por essência, é vicioso. O amor é uma ilusão que o envolve numa crença dogmática sem fundamento.

    Quarto preceito: O único prazer que deveria ter o homem é o de não fazer nada porque a vida não é nada mais que o vazio e o seu sabor não tem nenhum gosto. Assim, se este prazer não pode existir, tanto faz não ter nenhum prazer.

    Quinto preceito: Se não fazer nada é pecar, então pregar o pecado é virtuoso.

    Sexto preceito: A virtude é um vício quando elevada à condição de ícone dogmático e o vício é uma virtude quando deixa o homem livre de não fazer nada.


    Em Oanylone, sete virtuosos, aceitaram a fatalidade do destino e a punição de Jah, fazendo o mesmo que Lúcifer e os outros homens escolhidos pela Criatura Sem Nome. Sylphael, ele, incarnava o prazer e opunha-se a Lúcifer em todos os pontos, quando ele aparecia num lugar para pregar o amor de Jah e o prazer virtuoso, Lúcifer passava detrás dele para pregar o inverso. Isto durou seis dias, seis longos dias durante os quais os homens e as mulheres que ficaram em Oanylone escutaram Lúcifer ou Sylphael. Assim, veio o sétimo dia e Jah, na Sua cólera, fez brotar dos abismos da terra as lavas incandescentes e infernais que queimaram toda a vida. A terra rompeu-se de seguida para deixar Oanylone desaparecer no abismo do esquecimento.



    Uma eternidade de preguiça

    Lúcifer foi apresentado ao Altíssimo como cada homem e cada mulher que ficaram em Oanylone. Como todos os outros, não abjurou nenhum dos seus pecados e não reconheceu o poder do Altíssimo. Na Sua Santa ira, Jah lançou Lúcifer na lua para purgar uma vida de preguiça e pagar pelos seus pecados terrestres. A cólera do Todo Poderoso foi ainda mais forte, já que Lúcifer O tinha elogiado durante muitos anos antes de ceder à tentação da Criatura Sem Nome e de se afundar no vício. Tendo encarnado a preguiça durante uma grande parte da sua existência mortal, ele foi enviado sobre os enormes picos rochosos do Inferno e a sua aparência deformou-se, os seus músculos e a sua gordura derreteram e a sua pele apertou-se contra os ossos até se parecer um esqueleto. Para o punir por gastar muito tempo na ociosidade, Jah deu-lhe um corpo de um homem velho com uma barba desgrenhada e, finalmente, por causa dos muitos anos que passou a lamentar o seu destino sem pensar nos outros, Lúcifer foi condenado a derramar lágrimas quentes por toda a eternidade.



    O Altíssimo criou o Inferno que se encontrava na Lua afim de enviar ali as almas humanas mais vis. Ainda que lhes dera o seu amor e que Ele tivesse feito os seus filhos, muitos afastaram-se Dele e manifestaram unicamente vício e pecado, esquecendo a virtude e a amizade. Assim, entre os homens, aqueles que se abandonam, aqueles que se esquecem na ociosidade e na preguiça espiritual e aqueles que se dedicam à negação da vida e ignoram a sua própria satisfação, engrossam as fileiras das almas condenadas de Lúcifer, o Príncipe da Preguiça.


Traduzido do Grego pelo Monsenhor Bender.B.Rodriguez

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Adonnis
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MessagePosté le: Dim Sep 29, 2019 3:13 am    Sujet du message: Répondre en citant

Citation:
    Demonografia de Satanás, Príncipe-Demónio da Inveja



    O Nascimento de Satanás

    Era uma vez, há muito tempo, quando Oanylone abrigava uma vida agradável e tranquila, um jovem de boa família chamado Gaël Sibarita apaixonou-se perdidamente por uma das mulheres mais bonitas da cidade. Ela chamava-se Aurora. A cor dos seus cabelos loiros era igualada pela clareza dos seus olhos azuis e a sua gentileza e benevolência eram conhecidas por todos. Gaël começou a fazer-lhe a corte assiduamente e a bela Aurora não lhe ficou insensível. Depois de algum tempo, ela aceitou com prazer oferecer a sua mão a Gaël, que amava secretamente do mais profundo do seu coração desde há muitos anos.

    Os anos passaram-se e o casal era muito feliz. Mas Aurora não parecia ser capaz de ter um descendente. Ela sentia-se culpada por não ser capaz de dar ao seu marido o filho que tanto esperavam. Ela foi ver os melhores curandeiros de Oanylone e todos lhe prodigalizaram preciosos conselhos. Mas o tempo passava e nada acontecia, não conseguia gerar.
    Então Aurora rezou com toda a sua alma, de todo o seu ser. E a mulher, nas suas orações, apesar de ter um coração tão puro como a água de um rio, não pôde deixar de pedir, a qualquer custo, um filho. Ela estava disposta a tudo para tornar Gaël feliz e orgulhoso dela.

    O seu desejo, tão intenso, deve ter dado resultados, pois desta feliz união nasceu, nos primeiros dias da Primavera, uma criança de manifesta beleza. Uma cabeleira negra como ébano, olhos de um verde jade: foi a felicidade desta boa gente e o orgulho dos habitantes dos arredores. Ao ver este bebé que jamais se fartava do peito da sua mãe, Gaël decidiu então dar-lhe o nome de Satanás. Aurora e Gaël esqueceram rapidamente aqueles anos de tormento e beneficiaram de Satanás, o menino-rei desejado por tanto tempo.

    Os primeiros anos da sua vida a três foram abençoados. Tudo parecia ser propício a uma felicidade sem limites. Gaël tinha êxito nos seus negócios e ia constantemente ganhando mais dinheiro. Aurora era uma dona de casa ocupada e uma mãe amorosa. O próprio Satanás era uma criança viva e curiosa. Ele interessava-se por tudo e não importava que cometesse alguns disparates ou não, todos lhe perdoavam continuamente seus erros.
    Mas tal felicidade não poderia durar eternamente. Assim, quando Satanás atingiu as suas doze primaveras, Aurora subitamente ficou gravemente doente. Depois de vários meses de sofrimentos atrozes, ela morreu sem que ninguém a conseguisse salvar. Gaël, louco de amor e de tristeza, fugiu da vila e atirou-se do alto das falésias próximas de Oanylone.

    Satanás encontrou-se então sozinho, abandonado pelos seus carinhosos pais e contudo, percebia então naquele momento, em suas ausências, o quanto necessitava deles. Permaneceu naquela vasta mansão, herança envenenada de uma família destruída. Ele queria ir ao encontro da alegria da sua infância, custasse o que custasse. O jovem adulto colocou em mente levar tudo o que encontrasse em Oanylone e que tivesse um pouco de valor. Ele nunca estava satisfeito. Ele nunca tinha o suficiente. Nada do que adquiria encontrava graça aos seus olhos. Nada do que lhe oferecia a Vida conseguia preencher o vazio aberto que inspirava o jovem homem de olhar desconfiado.
    Ele mudou irreversivelmente e perdeu pouco a pouco o brilho infantil que a sua mãe lhe tinha transmitido.

    Os seus pensamentos sombrios e as suas dores infinitas atraíram a Criatura Sem Nome para perto desta criança. Vendo nele um hospedeiro predestinado a portar em si um dos pecados do mundo, ela acabou por sobrecarregar o jovem coração de Satanás com amargura e pesar, para lhe deixar uma inveja insaciável e inesgotável.




    Para sempre, riquezas acumuladas...

    Satanás ainda era jovem quando fez crescer escandalosamente o seu domínio, à custa dos camponeses da região. Ele virou-se contra eles e empobrecia-os sem remorso algum, reivindicando-lhes metade da sua renda e, apesar de ter ganho num dia o que seria suficiente para qualquer um para toda uma vida, mostrava-se sempre insatisfeito.

    O infortúnio destes homens regozijava-o, a desgraça dos madeireiros contentava-o. E, cada dia e a cada hora, deseja provocar ainda mais tristeza, ainda mais desespero, ainda mais rancor. Porque nada a seus olhos valia o que sentia nas profundezas do seu ser. Porque os seus sentimentos tinham-se transformado em ódio contra a Humanidade, contra aqueles que ainda poderiam aspirar à felicidade.

    Este era o seu alimento, a vingança contra a vida, a sua própria vida.




    E a inocência veio resistir-lhe...

    Num dia de Inverno, enquanto percorria as suas terras, Satanás viu uma pequena cabana escondida atrás de grandes árvores. Furioso por ver que alguns se escondiam e não lhe pagavam as dívidas que lhe deviam, ele abriu com um grande estrondo a porta. Diante dele, apareceu uma jovem menina de uma graça divina, com a pele leitosa e lábios vermelhos.

    Ele imediatamente soube que lhe devia pertencer, como todas as coisas belas deste mundo. Ele exortou-a então a segui-lo para que viesse ao seu domínio afim de que se pudesse casar com ele. Infelizmente para ele, Eleanor, pois esse era o nome dessa jovem, dedicou a sua existência ao Altíssimo e recusou casar-se com o belo e tenebroso Satanás. Ele decidiu então seduzi-la como anteriormente o fizera o seu pai Gaël com a sua mãe Aurora. Porque estava claro no espírito doentio do jovem homem que Eleanor teria a sua descendência. Mas Eleanor, diariamente, recusou os seus avanços, sendo eles doces, apaixonados ou de uma violência inegável. Cada dia, Satanás regressava a casa lívido de raiva e cada dia ele fazia executar um dos seus escravos.

    Na noite do nonagésimo nono dia, louco de fúria por ainda ser rejeitado por uma miserável, ordenou aos seus lacaios que a prendessem e torturassem antes de a queimarem viva. Estes últimos pertenciam à guarda pessoal do jovem senhor e trabalhavam em suas terras encarregando-se da recolha dos bens dos habitantes e de os fazer sofrer mil dores, se eles se recusassem. Fizeram então segundo a sua vontade.

    Os gritos de Eleanor encheram o domínio e a pobre ardeu durante horas. Ao cair da noite, sobre o cadáver da virgem ainda fumegante, Satanás recuperou uma cornalina cor de sangue que ela usava ao pescoço e que devia ser o seu único tesouro. Colocando o pingente sobre ele, mostrava assim orgulhosamente a vitória que obtivera contra a jovem rapariga.

    Satanás continuou o seu caminho até o Último Vício, até a aniquilação. Dois dias depois desse infortúnio, um dos seus tenentes de confiança, Simplicius, apaixonou-se por uma das mulheres que vivia na cidade. Não conseguindo seduzi-la, quis levá-la pela força, mas um homem interveio e arrancou-lhe o olho direito.
    Era Miguel.
    Humilhado, Simplicius advertiu o seu mestre Sibarita que, enojado com a raça feminina desde a morte de Eleanor, enviou todo um batalhão para prender a família de Emília.

    De seguida, ordenou aos seus capangas que fizessem vir, cada dia, uma mulher da cidade, para que se entregasse a ele e aos seus desejos. Todas aquelas que se recusassem, morriam. As outras viveriam ainda por algum tempo.

    Mas isso não bastava para o fazer feliz, e ainda queria mais: as mães, as virgens, os tesouros, os campos.... Nada poderia agradar Satanás e o seu corpo marcava-se cada vez um pouco mais das atrocidades que fazia suportar aos outros.

    O seu desejo não conhecia descanso. Os sofrimentos que suportavam os habitantes de Oanylone também não.
    Neste momento, Satanás não tinha nada de humano e a sua aparência bestial assustava qualquer um que cruzasse o seu caminho. Tumores deformavam a sua cabeça e cada pedaço da sua pele estava recoberto de cicatrizes, vestígios de impulsos sádicos.




    Jah castiga então os homens...

    Devemos saber que, naquele tempo, Satanás não era o único homem a abandonar-se aos pecados. A cidade de Oanylone, outrora tão próspera, tornou-se o Antro do Vício e a Criatura Sem Nome desfrutava o caos que ali reinava.
    Furioso, Jah decidiu então punir a raça humana destruindo integralmente a cidade de Oanylone.

    Alguns, então, que não entendiam o quão graves eram as suas faltas e que não podiam aceitar a ideia de deixar esta vida de doces sabores por uma decrepitude certa, decidiram fugir para escapar da Ira Divina.

    Outros, em número de sete, perfeitamente conscientes dos vícios que encarnavam, foram escolhidos pela Criatura Sem Nome. Eles pregaram, sobre o seu comando, a rebelião contra o Altíssimo e conseguiram reunir numerosos apoiantes à sua causa.

    Satanás, pregou sobretudo o seu ódio. A sua energia decuplicada pelo apoio da Bestia Innominata, levou-o a infundir a cada um o desejo que todo o homem tinha que ter. Este desejo era a encarnação de toda a perversidade humana e Satanás personificava-o. Gritava-lhes para que desejassem, sempre e sem trégua. Exortava-os a desejar sempre mais, a entregar-se totalmente a um desejo, como um fim em si mesmo. O Príncipe Sibarita, conhecido como Sy, tão convencido dos propósitos que clamava, que convenceu as pobres almas. Ele exultava, ele rejubilava.

    Os seus olhos verdes de luminescência cadavérica cativavam a multidão, a sua riqueza e a sua beleza demoníaca tornaram-se os primeiros desejos dos seres que o ouviam. Todos elogiavam a sua presença e a sua virilidade. A multidão começou a desejar-se entre si. A Inveja fez-se o fel que escorria por todo o lado. Na enchente de vício permanente que inundava a cidade maldita, os horrores tornaram-se legiões sem nome e sobre a imundície putrefacta dos vestígios do passado, Satanás manteve-se orgulhosamente de pé com as outras seis encarnações demoníacas, em sinal de desafio contra o Único.

    No sétimo dia após a sentença de Jah, a cidade foi engolida e, com ela, as sete encarnações do pecado. Satanás não sentiu dor alguma, pois o seu espírito tinha tomado posse do seu corpo e estava envolto nos numerosos desejos que tinha em si. Depois de ter perdido a razão, ele não percebeu que não desejava nada mais. Ele tinha no seu ser o último desejo de querer desejar.




    Ele permanece para a eternidade com os seus pecados...

    Satanás foi enviado com os outros seis homens para a Lua e foi punido com uma eternidade de sofrimentos com o título de Príncipe Demónio.

    O seu corpo, já contundido ao extremo, transformou-se para reflectir a escuridão da sua alma.

    A sua cabeleira, que anteriormente era o seu orgulho, alongou-se e impregnou o seu corpo para formar nas suas costas duas grandes asas quitinosas semelhantes às dum morcego. As lágrimas dos seus belos olhos, que fluíam pela raiva e desejo irracionais, misturaram-se então com a pedra de Eleanor e acabaram por colorir pouco a pouco o seu corpo. A sua pele tomou, de seguida, uma cor ametista. A pedra de Eleanor incrustou-se na sua carne e assim incrustada, recordava-o para toda a eternidade do seu amor perdido.

    Cercou-se, nos seus tormentos eternos, de ouro, de prata e de jóias, dentre os mais requintados pratos, de homens e mulheres cujos corpos rivalizavam em beleza. Ele deixou cada um deles devorar com o olhar os seus tesouros e as suas maravilhas até que eles mesmos se devorassem interiormente.

    De facto, na sua crueldade absoluta, ele decidiu que quem tocasse naquilo que ele tinha armazenado, sofreria uma dor terrível. Assim, conservou o seu saque. Assim, poderia ver o seu próprio desejo nos olhos dos outros. E tinha prazer em observar o sofrimento que o roía a si mesmo.




    Ao Príncipe-Demónio opõe-se o Arcanjo...

    A Satanás, Príncipe-Demónio da Inveja, opõe-se Miguel, o Arcanjo da Justiça. Este último era, nos tempos da sua vida, o irmão da bela Emília, por quem se havia apaixonado um dos seguidores de Satanás.

    Além disso, encontramos Satanás a batalhar contra ele na célebre lenda do Monte de São Miguel que remonta à época em que certos bárbaros veneravam Deuses alcoólicos.

    Um deles, de nome Saathan honrava o seu Deus sacrificando-lhe crianças. Este bárbaro perseguia uma comunidade de fiéis que tentava fugir, mas que se encontrava bloqueada em plena floresta, perto do oceano.

    Preferindo morrer nos braços do oceano do que nos de Saathan, os fiéis rezavam a São Miguel para que preparasse a sua chegada.

    O Altíssimo, em desacordo com essa decisão, porque o Homem não tem que decidir a hora onde se irá reunir ao astro solar, ordenou-lhes por intermédio de um mensageiro celeste que construíssem uma paliçada com a ajuda de troncos de árvores. Quando ela estivesse construída, eles deveriam então acender uma grande fogueira a fim de que o Bárbaro descobrisse a sua posição.

    Os fiéis executaram a vontade de Jah e, depois de sete dias, a fogueira foi acesa. As tropas de Saathan chegaram então e começaram a atacar a paliçada. No momento em que a comunidade se preparava para se defender, munidos de pedras e lanças, o Arcanjo Miguel, vestindo uma armadura e empunhando uma lança e um escudo, apareceu no meio das chamas que haviam sido acesas algumas horas antes.

    O Santo Miguel lançou a sua arma sobre o horizonte e o mar, ergueu-se, engoliu as tropas do bárbaro.

    O Arcanjo Miguel reconheceu imediatamente em Saathan o seu inimigo íntimo. Os seus olhos verdes de luminescência cadavérica não deixavam qualquer dúvida. O pagão havia sido possuído pelo Príncipe Demónio e corrompido pelos mesmos pecados que Satanás: a inveja inalterável de ter o que desejava, sem que ninguém lhe opusesse resistência.




    No coração dos pecadores, ressoa o Canto de Satanás...

    Satanás, quando ainda era jovem e vivo, era conhecido por cantarolar a todas as horas do dia ou da noite, estas palavras.
    Estas palavras não foram perdidas, uma vez que qualquer um que deixe escurecer o coração pelo vício do desejo tem este refrão em mente:


    Citation:
    "O desejo procura,
    Um precioso coração, ele procura.
    Deixa-me ver se é o teu
    E então, ele me pertencerá.
    E se tu não o tens?
    O desejo procura,
    Tudo o que tens, ele procura.
    Deixa-me destruir-te para me enriquecer,
    Para te tornares meu."


Traduzido pelo Monsenhor Aranwae

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